Disgaea 6: Defiance of Destiny | Review
Disgaea 6: Defiance of Destiny marca o retorno da série de RPG de combate tático seis anos após Disgaea 5: Alliance of Vegeance. Desenvolvido e publicado pela Nippon Ichi Software (representada no ocidente pela NIS America), o título aproveita sua genética ao fugir do convencional com seus debochados diálogos orientados para adultos, exorbitantes pontos de experiência e de dano graças aos combos e a história do garoto zumbi e falastrão Zed na tentativa de derrotar o Deus da Destruição e assim romper com seu destino.
Finalmente chegou minha vez de descobrir a franquia!
Com exclusividade ocidental para Nintendo Switch, Disgaea 6: Defiance of Destiny chega no próximo dia 29 de junho. No Japão, o jogo foi lançado em janeiro também para PlayStation 4. Quer saber como foi descobrir esse título novo (para mim) e a inédita aventura Disgaea? Leia a análise e descubra!
A primeira impressão é muito… doida!
Já há alguns anos tinha a curiosidade de jogar Disgaea, cujo título em japonês literalmente significa Crônicas do Inferno Disgaea. Mas não joguei. Tive a chance no Nintendo DS e deixei passar.
Com o Switch em mãos, vi que o console abrigou remakes e edições completas: Disgaea 1 Complete, Disgaea 4 Complete+ e Disgaea 5 Complete (os links levam para a eShop estadunidense). Estes sempre estiveram no meu radar e, mesmo assim, passaram ignorados.
Agora joguei Disgaea 6: Defiance of Destiny e consequentemente acumulei mais esses três títulos para a minha lista de espera. Em posições privilegiadas, diga-se de passagem.
Vamos direto ao ponto: Disgaea 6: Defiance of Destiny me surpreendeu e me surpreendeu MUITO!
Fãs de combate tático sobre um tabuleiro, com diferentes classes de personagens, raças, profissões e armamento específico, bem no estilão Final Fantasy Tactics, vão se sentir em casa e, ao mesmo, encontrar muita originalidade.
Tem um detalhe: você só não pode ser exigente com a temática, já que Defiance of Destiny – assim como toda a série Disgaea – se passa no Inferno ou em dimensões paralelas de submundos, rompendo com aquelas ideias tão comuns de fantasia medieval ou de odisseia espacial.
Embora tenha mecânicas muito similares às da saga da Square Enix, Disgaea 6 apresenta truques próprios na manga e se aproveita muito mais da miscelânea de gêneros, transitando por diversos estilos e obrigando jogadores a dominarem muitas funções. Já falo mais sobre isso adiante, quando falar da jogabilidade.
Na abertura, percebi logo de cara que o diálogo de Disgaea 6 é engraçado e maldoso, como a programação para adultos do antigo canal Locomotion ou de um episódio de Frango Robô.
A premissa
O protagonista é um garoto chamado Zed, acompanhado de seu cão, Cerberus. Um detalhe: ambos são zumbis, a segunda castas mais baixa dos seres infernais, à frente somente dos Prinnies (umas criaturinhas parecidas com pinguins que são, na verdade, espíritos de humanos pecadores). Zed é bem presunçoso e, por ser um zumbi, vive sendo menosprezado, assim como sua irmã, Bieko.
Certo dia, o Deus da Destruição ameaça o mundo dos (des)vivos. Zed, teimoso e falastrão, resolve enfrentar o mau e, pela jornada, encontrará um elenco diverso e cheio de personalidades fortes, cada qual enfrentando dilemas ou encarando obsessões de sua dimensão.
Sim, Disgaea é sobre viajar entre diversas dimensões em busca do Deus da Destruição. Para isso, Cerberus cria um mundo seguro, o hub de nossa aventura, e de lá escolheremos para onde ir, tendo como destino inúmeras realidades alternativas e bizarras.
Ah! Cerberus é facilmente um dos melhores personagens da história recente dos games! Às vezes solta uma piada escatológica, outras tantas uma piada existencial (numa mistura de lamento com desdém). Ocasionalmente sobra até para a quarta parede.
Por ser um zumbi, Zed já está morto e, ainda por cima, tem a capacidade de Super Reencarnar (Super Reincarnation), permitindo-lhe voltar mais forte sempre que morrer novamente. Os primeiros minutos mostram o garoto em busca do trono para tornar-se o novo Deus da Destruição, depois de já tê-lo vencido. A partir daí, Zed começa a contar sua odisseia nefasta e, ao mesmo tempo, emocionante – recheada com cinismo, tragédias e superação.
Para evitar spoilers, vou dizer que – embora tenha conversas divertidas – Disgaea 6 traz temas muito interessantes por debaixo de sua capa tão abobalhada. No começo fica clara a luta de classes dos Prinnies (reforço: não são pinguins!), os peões mais rasos do Submundo, e dos zumbis, vassalos com status justo acima dos Prinnies.
O subtítulo resume tudo isso muito bem: Defiance of Destiny.
A riqueza do elenco e do conto subverte cargos e posições – o protagonista é um anti-herói, completamente falho e com um comportamento muito moleque; o rei é avarento e covarde, apesar de pertencer à classe de guerreiros; a princesa não é recatada e do lar, mas atirada, quebrando o estereótipo das donzelas. O sujeito antes predestinado a ser herói é, na realidade, um babaca.
Há ainda a sátira política com o recurso para ganhar vantagens que consiste em entrar na Assembleia Escura (Dark Assembly) e pagar propinas para “ajudar” no resultado da votação. O tal lugar é como se o Congresso. O jogador vê a inclinação dos congressistas em certos temas (como trazer itens de melhor qualidade para a lojinha ou receber subsídios) e saberá quais as melhores propinas para converter votos a seu favor.
Ei, som
A introdução se estendeu um pouco além do convencional já que precisei fazer todos os tutoriais. Disgaea aparentemente não é para os fracos e tem milhares de comandos e mecânicas. Justamente por isso acompanhei todos os diálogos e percebi que…
A primeira coisa que chamou minha atenção foi algo atípico: a qualidade da dublagem em inglês é incrível.
Os personagens, principalmente Cerberus, abrem a boca e logo ganham vida, passam motivação e transparecem personalidade. Por isso, se você pretende jogar Disgaea 6: Defiance of Destiny, o faça com volume alto.
Infelizmente, o jogo não foi dublado ao português nem as legendas e os menus traduzidos. As falas existem somente em inglês e japonês. Seria um trabalhão fazer uma dublagem bem-feita, mas teria sido incrível, pois há muito tempo um RPG não me cativava tanto.
Outro aspecto muito legal e extraordinário é a trilha sonora, tanto no hub quanto campos de batalha. No combate, as animadas músicas são meio circenses, meio macabras! É tão incomum ver uma produção neste estilo que logo fui fisgado pelas peculiaridades do título.
Obviamente, você vai ouvir vários efeitos sonoros e frases repetidas de vendedores inúmeras vezes. Em certas ocasiões criamos uma remixagem chatinha, mas perdoável, como ao recolher várias Missões (Quests) do mural de uma única vez e apertando o botão A aceleradamente.
Fora do padrão estético
Segundo seus criadores, Disgaea 6: Defiance of Destiny é o primeiro da franquia a ter todos os personagens tridimensionais no campo de batalha. Mesmo com o polígonos, Disgaea 6 parece um anime, graças ao filtro cel shading.
Quando dei o subtítulo “Fora do padrão estético”, foi pensando nos visuais infrequentes para um RPG, pois o jogo é bonito. De jeito algum!
Talvez seja só comigo, mas ao ouvir “RPG” é fácil assumir um cenário de fantasia medieval, tal qual disse no começo.
Acompanhar um zumbi prepotente do Inferno com seu doguinho sarcástico conferiu a Disgaea 6 uma paletade cores única, com tons escuros, cheia de violeta, vermelho e cinza. A escolha insólita proporciona uma sensação no jogador equivalente a um “Ei, esse jogo aqui é diferente!”, rompendo de verdade com algumas noções clássicas.
Além dessa curiosa paleta de cores, o conto de Zed se destaca e foge dos gráficos comuns por apresentar montes de personagens diferentes e lindos cenários. São tantos mundos a serem visitados que vemos, por exemplo, o sombrio Inferno, a ensolarada dimensão dos humanos e o sutil mundo musical.
Me desculpe o chavão, mas Disgaea 6 é um colírio para os olhos. Um colírio muito peculiar com visão isométrica. Contudo, existe um detalhe técnico, a opção de escolher entre modos de qualidade gráfica:
- Desempenho (Performance), priorizando a taxa de quadros por segundo em detrimento da resolução
- Equilibrado (Balanced), ajustando resolução e taxa de quadros de acordo com o momento
- Gráfico (Graphics), com a melhor resolução possível, comprometendo a fluidez do jogo
Assim como no departamento de som, tenho uma ressalva: com tantas mecânicas e com uma jogabilidade pra lá de complexa, a interface é um de dois gargalos em toda a experiência. Jogadores se sentirão naturalmente perdidos antes de esboçarem a dominar botões e submenus. Navegar pelos menus não é difícil, mas intimidador.
Lá pelas 20 horas de jogo eu ainda me sentia confuso e, mesmo depois das 45, não tenho certeza se posso encontrar alguns recursos sem desperdiçar tempo procurando.
Jogabilidade complexa nível 9.999.999
O segundo gargalo está certamente na jogabilidade.
Soa como um demérito, contudo não é bem assim. A complexidade é o grande charme de Disgaea 6 e, como é de se esperar, jogos muito complexos intimidam os jogadores.
Lembra que não pulei nenhum tutorial e nenhuma fala? Por aí já dá pra sacar que entender o combate é fundamental, assim como dominá-lo. O título introduz todos os conceitos com parcimônia, sem saturar quem está no controle. Porém, é feito às custas de fluidez, uma vez que o ritmo nas primeiras horas é consideravelmente lento.
Nem a divertida narrativa consegue quebrar a morosidade do começo.
A batalha inicial acontece contra os guardas demoníacos e monstruosos do fúnebre palácio do Deus da Destruição e ensina o básico: você tem que manter o combo ativo durante o turno para aumentar o multiplicador e causar mais dano.
Espera! Eu disse que isso é o básico?
Um dos atrativos de Disgaea são os números absurdamente altos para tudo.
Pra começo de conversa, os guardas estão no nível 999. Movimente o cursor pelo tabuleiro e espie as características de cada “peça” (neste caso, personagem): resistência aos elementos, como fogo, gelo ou vento; resistência a tipos de arma, como machados ou espadas; acurácia do golpe escolhido…
Tem até um termômetro que acumula o dano causado durante a batalha e proporciona recompensas ao final – quanto mais dano causado, melhor a recompensa.
Eu também disse que Disgaea se parece com Final Fantasy Tactics, né?
A ação de Disgaea 6 acontece no campo de batalha com vista isométrica. O jogador traz soldados das mais diferentes classes e os posiciona para obter vantagem e considerando terreno, desníveis, vãos e paredes.
Uma das melhores estratéicas é fazer um verdadeiro montinho contra um único inimigo! É divertido buscar minuciosamente o melhor resultado.
Como de costume em jogos do estilo, esteja atento antes de tudo ao nível de seus oponentes e, em seguida, aos sistemas de vantangens e desvantagens impostos por armas, profissões e elementos mágicos.
Disgaea 6 é fundamentalmente Pedra, Papel e Tesoura caso Pedra, Papel e Tesoura fosse a lista de material escolar inteira. Para isso, Disgaea 6: Defiance of Destiny implementa algumas funções peculiares.
O jogador deve usar seus soldados para manter um combo ativo no mesmo turno e arrancar milhões de pontos de dano dos adversários. Atenção! O mesmo pode acontecer com um soldado seu se encurralado. Esses números imensos passam uma ideia de crescimento rápido, o Whey Protein dentro do jogo.
Aparentemente Cerberus tem poderes fora do normal e criou um mundo seguro em uma dimensão distante do Deus da Destruição. Você será transportado para esse mundo, o hub, durante intermissões.
Aos poucos, nas primeiras horas de jogo, os personagens desse hub inauguram seus comércios – a loja de itens primeiro, a de habilidades em seguida… Mais tarde, o mural de missões, com pedidos de todo tipo – colete um item ou mate tantos inimigos.
Dava pra escrever uma enciclopédia a respeito sobre cada um. Basta dizer que, após a confusão inicial, consegui alinhar as ideias e funções de modo intuitivo.
Três comércios merecem destaque: o laboratório de pesquisa, a barraca de sucos e o mundo de itens.
Em primeiro lugar, o laboratório de pesquisa serve como missões de envio de personagens sobressalentes de seu time. Eles partirão em busca do item definido pelo jogador. O estande é interessante para ganhar experiência de modo passivo com combatentes nem sempre presentes nas batalhas.
Logo depois, a barraca de sucos e uma das principais mecânicas de Disgaea 6: Defiance of Destiny: a tal da Super Reencarnação (Super Reincarnation). De forma resumida (por que, sim, é complicadíssima), a aventura de Zed não é só um RPG, mas traz mecânicas Rogue-like, ou seja, a cada morte, Zed volta ao nível 1. Só que… preservando pontos de Mana, experiência, equipamento e algumas outras cositas más.
“Super Reencarnar” é uma escolha do jogador, deliberada, de “se matar” e voltar ao nível 1, convertendo os níveis “perdidos” em Mana que, por sua vez, será distribuída livremente nos pontos de ataque, defesa, inteligência, saúde, velocidade etc.
O difícil e demorado foi entender qual era o momento ideal para “Super Reencarnar”, afinal de contas, o game não é brutalmente difícil se você garimpar um pouco de experiência; porém, ele só deslancha mesmo se o jogador sacrificar níveis para melhorar atributos e voltar mais bestial que antes.
Por último e não menos importante, muito pelo contrário, o lugar onde passei horas e horas, me afastando da campanha, está o mundo dos itens (Item World). Aparentemente é algo recorrente dos jogos Disgaea, pois Cerberus pergunta se estamos acostumados com a lojinha.
O mundo dos itens funciona mais ou menos assim: é uma masmorra infinita na qual devemos passar ao tabuleiro seguinte por meio de um portal ou vencendo todos os inimigos. É como saltar de um campo de batalha a outro infinitamente.
Ou melhor: os campos de batalha estão para o Item World assim como as linhas estão para Tetris.
Antes de entrar, escolhemos uma arma ou armadura do inventário (ou equipada) que ganhará níveis e experiência a cada campo de batalha superado. Desta forma, o lugar é excelente para melhorar equipamento e garimpar experiência também para os personagens, além de ser altamente viciante.
Pela descida (é uma descida, né?), cenários gerados aleatoriamente e alguns postos de descanso no meio do caminho, como batalhas de chefes, salas de tesouro e hospitais para recuperar a tropa – que não recupera energia automaticamente entre pisos. Em algumas ocasiões, esbarrei com um banco e a caixa, achando se tratar de um roubo, dá montes de dinheiro até perder a paciência e recrutar guardas – o legal é que o ponto de “perder a paciência” é ao acaso em todo encontro.
Por fim, outra mecânica que quero destacar, é a habilidade de personagens levantarem e arremessarem caixas e outros personagens. Dá pra fazer um verdadeiro Cirque du Soleil e empilhar muitos combatentes para atravessar o campo só arremessando os parceiros – criando oportunidades estratégicas salvadoras e diferenciadas, algo muito legal e que só adiciona mais camadas a este incrível jogo.
Com tanta coisa acontecendo, a jogabilidade é o segundo gargalo, pois para tamanha amálgama de recursos, controlar o cursor em um espaço tridimensional isométrico e se encontrar acaba ficando complicado no começo. Nada para retirar o brilho do jogo, porém causa uma certa frustração por ser tão pouco intuitivo.
Conteúdo adicional
Disgaea 6: Defiance of Destiny muito provavelmente vai ter conteúdo adicional no futuro. Descaradamente, um dos comércios no mundo seguro é uma lojinha de DLC que vende vários pacotes com multiplicadores de experiência, mana e itens.
Esses “adicionais consumíveis” são completamente desnecessários para a aventura, mas vale lembrar que – por enquanto – alguns personagens clássicos da franquia estão disponíveis gratuitamente no jogo. São eles: Adell (Disgaea 2), Rozalin (Disgaea 2), Girl Laharl (Disgaea D2) e Asagi (Makai Wars). É bacana ver que, para tê-los no time, você terá que vencer cada um em seu respectivo campo de batalha. Uma dica: não faça isso logo de cara!
Além disso, o trailer acima mostra ataques especiais de cada classe diferente e um DLC que estava disponível somente para a versão japonesa, com personagens Hololive. O conteúdo será liberado gratuitamente para todo o mundo. Hololive é um grupo de Vtubers popular entre os fãs dos jogos, anime e mangá de Disgaea. O pacote inclui um total de cinco membros Hololives e cada um deles dubla um personagem.
Vale a pena jogar Disgaea 6: Defiance of Destiny?
Defiance of Destiny, para mim, foi uma surpresa enorme. Tendo jogado jogos como Final Fantasy Tactics Advance e Final Fantasy Tactics A2 à exaustão, Disgaea trouxe a articulação meticulosa e as mesmas sensações de estratégia, de recompensa e de se sentir inteligentão ao superar uma batalha sem arranhões.
Trouxe mais do que isso: ar fresco sobre um gênero que virou um clichê caricato de jogos de fantasia medieval. Disgaea 6: Defiance of Destiny me surpreendeu em todos os fatores técnicos com sua narrativa intrigante, dublagem excelente, visuais peculiares, suas diversas mecânicas elaboradas e importadas de diferentes gêneros e, como resultado dessa soma toda, um ciclo de jogatina viciante. Eu precisei entre 45 e 50 horas para ver o final, isso com fugas intermináveis para o mundo dos itens, um lugar que continuo voltando e quero voltar depois da análise.
Caso você curta animes como Full Metal Alchemist: Brotherhood e histórias fantásticas e sobrenaturais, dê uma chance à versão de demonstração. Se gostar, o progresso é compatível com a versão completa, que durará dezenas ou até centenas de horas. Talvez o maior proibitivo na realidade brasileira é o preço de R$ 305,95 pela Loja Nintendo. Pode ser que valha a pena começar pelos outros capítulos da série.
Agora, dá licença que isso é justamente o que vou fazer: priorizar os jogos Disgaea.
*Review elaborada com código fornecido pela NIS America.