Pepper Grinder | Review
Preparem as brocas, marujos! A caça ao tesouro de Pepper Grinder zarpa para o Nintendo Switch e para computadores, via Steam, neste 28 de março.
O jogo de aventura 2D traz muita ação e energia dos 16 bits, colocando-nos no controle de Pepper, uma capitã destemida na busca de recuperar sua fortuna roubada. Prepare-se para cavar fundo por terrenos traiçoeiros, pulverizar inimigos que te atrapalham e pilotar veículos irados – tudo para resgatar seu precioso tesouro!
Desenvolvido apenas por Ahr Ech e seu pequeno time, o compositor XEECEE mais a galera responsável pelos ports na MP2 games (os links levam aos perfis no X, antigo Twitter), o título frenético foi publicado pela curadoria cuidadosa da Devolver Digital, que mandou uma chave de Nintendo Switch para o Pizza Fria e, agora, meu único intuito é responder uma pergunta: “Será que Pepper Grinder vale a pena?”
Spoiler: se você cresceu jogando plataformas no Super Nintendo ou Mega Drive durante os anos 1990, Pepper Grinder é o título que faltou no acervo desses consoles.
Pimenta é refresco
Pepper Grinder já estava anunciado muito antes de eu me dar conta da sua existência. O game estava na seleção da Indie World Showcase do finzinho de 2022, prometido para o ano seguinte e felizmente adiado para este ano. Digo “felizmente adiado” pois só tomei conhecimento dele na transmissão Nintendo Direct: Partner Showcase de fevereiro de 2024. Sabe quando você anota os nomes dos games durante um evento para assim adicioná-los à sua lista de desejos depois? Pois o jogo da menina com cabelo azul que pilota uma broca pela areia como se fosse um jet ski foi um dos poucos que me chamaram a atenção.
E, para a minha felicidade, ainda bem! Pepper Grinder pode até começar bem basicão, mas as rotações por minuto aumentam progressivamente num game de plataforma eletrizante que engrena visuais retrôs, jogabilidade responsiva e única com uma trilha sonora sintetizadona que só uma MIDI poderia oferecer.
Antes de destrinchar cada aspecto, o mais legal é como Pepper Grinder é moderno ao mesmo tempo que parece ser um jogo perdido do Super Nintendo. Isso significa que ele é rápido e furioso como F-Zero, com ação a 60 quadros por segundo; desafiador como Donkey Kong Country, já que a coordenação motora precisa estar em dia; e arrepiante como quando Paranoid do Black Sabbath toca em Rock n’ Roll Racing, uma vez que aumentar o volume é inevitável – minha mulher teve que me ligar por vídeo do quarto ao lado, pois eu estava com o fone ao máximo.
Acho que o termo “durão” envelheceu engraçado para aquilo que os americanos chamariam de “bad ass”, mas o arranque da furadeira e as poses de Pepper em toda -santa- fase passam essa sensação de que o bicho vai pegar – e é você no controle. E o “throwback” (ou retorno, em bom português) à era 16 bits fica nítido até no maravilhoso manual em PDF que os criadores fizeram, imitando o leiaute dos manuais de jogos do Super Nintendo, com sua capa preta e linhas vermelhas. Dá vontade de imprimir e emoldurar.
Hora da aventura: “meu tesouroooo” 🏴☠️🪙
Esse manual estilizado conta a história de Pepper Grinder: num mundo onde nações poderosas se digladiam em guerras intermináveis, as ilhotas, enseadas e canais que cercam seus países vivem hoje infestados por piratas e corsários caçando tesouros. A era da pirataria voltou com tudo!
Mas nem todo lobo do mar nesse faroeste oceânico quer pilhar inocentes. A caçadora de tesouros Pepper só quer saber dos espólios. Ela navega os traiçoeiros sete mares em busca de relíquias perdidas, e diga-se de passagem, acumulou uma bela fortuna. Bom, acumulou, no passado mesmo, já que uma tempestade violenta despedaça seu navio e a joga em uma ilha desconhecida.
Ao acordar, dá de cara com um bando de criaturas parecidas com narvais, os Narlings, fugindo com seus preciosos tesouros.
É assim que Pepper inicia uma jornada explosiva por essa ilha perigosa e cheia de segredos para buscar de volta aquilo que é seu, com a ajuda de uma ferramenta bem poderosa chamada Grinder. Esses pilhadores safados vão se arrepender em 3, 2…
Pepper Grinder não apresenta todas suas armas logo de cara. Pelo contrário: até o último estágio, o jogo sempre apresenta uma mecânica nova ou faz algo para mudar seu ritmo. E, talvez por culpa do início um tanto lento, muita gente não tenha curtido a versão de demonstração que está disponível para PC e para Nintendo Switch.
Aperte o gatilho para triturar
Comece um novo jogo para viver a continuação do dossiê escrito no manual: Pepper acorda e vê o fruto do seu trabalho duro sendo levado. E quem é aquela figura misteriosa que parece ser a líder dos Narlings?
Assim, a primeira coisa a se fazer é se levantar da areia da praia para correr atrás dos ladrões! Mas enquanto Pepper atravessa a ponte de madeira, a líder corta suas cordas e ela cai, encontrando essa ferramenta chamada Grinder e que parece uma furadeira com uma broca gigante.
Inimigos não são o foco na primeira fase, que ensina o básico: um botão salta, outro ativa Grinder. Certos terrenos são penetráveis, como a areia, e, ao começar a rotação, Grinder nos puxa solo adentro em constante movimento e lá ficaremos até voltarmos à “superfície normal”, usando o analógico para escolher a direção.
Porém, muitas das nossas moedas douradas, esmeraldas, rubis e safiras estão no meio do terreno fofo ou desses futuros lamaçais. Além de alguns segredos que revelam mais tesouros, como, por exemplo, contornar um trecho em círculos para que o centro revele uma abundante quantidade de ouro!
Essa movimentação única ficará cada vez mais veloz, mais intensa, mais desafiadora. Ainda no início, o jogador descobre que se apertar o botão de pulo justo antes de sair do lamaçal, Pepper vai pisar fundo na aceleração de Grinder e saltar mais longe que o normal. A técnica serve ainda para emendar ataques ou, quando na água (sim, temos fases aquáticas!), fazer chapeletas para ganhar velocidade e fugir de situações perigosas.
Grinder é uma ferramenta mil e uma utilidades nesta jornada para reaver o tesouro roubado, pois além de perfurar a terra fofa, servir de jet ski e triturar inimigos, ela se encaixa em chaves especiais e em outras armas, como metralhadoras. Tamanha versatilidade faz o giro ser útil para acionar plataformas móveis e montes de outras coisas.
Cara ou caveira?
Dá pra imaginar, por se tratar de um jogo de plataforma, os infinitos pedacinhos escondidos nos níveis, revelados aos jogadores graças às sutis rachaduras nas paredes rochosas. Como chegar nesses cantos secretos são outros quinhentos… eles, porém, são muito importantes, já que costumam abrigar enormes e valiosos medalhões dourados com uma caveira gravada.
Toda fase guarda cinco deles, deixando alguns mais à vista, outros nem tanto. Recolhê-los é essencial para seguir adiante pelos quatro mundos, cada qual com um punhado de fases e uma loja de curiosidades. Ah, sim! Essas lojas têm em suas vitrines diferentes chapéus e cores de cabelos para Pepper, meros cosméticos para colorir a aventura. Além disso, todas têm também adesivos e chaves douradas – todos os itens citados são pagos com os medalhões de caveiras.
Os dois últimos itens têm utilidades diferentes. Primeiro, as chaves abrem caminhos bloqueados ou para cenários extras. Já os adesivos servem uma tela para brincar e colocar selos, pois eles são colecionáveis e contêm paisagens diferentes do jogo, como se fossem cartões postais. Os selos, por sua vez, contém inimigos variados em poses diferentes, aviões, elementos do cenário como minas explosivas, Pepper também em várias ações e por aí vai.
Para obtê-los, basta ir até a máquina gashapon mais ao fundo da loja. Usando Grinder para girar o botão, é só esperar que a máquina dispense uma bolinha sorteada, ao preço de 100 moedas convencionais que você vai recuperar cada vez que repetir um nível. São muitos selos para colecionar e dá pra brincar de colagem eles sobre os adesivos, mas nada mais envolvente, como fabricar pequenos cenários jogáveis.
Uma outra dispensadora gashapon está presente nessas paradas, mas ela cumpre um propósito mais nobre: aumentar a saúde de Pepper até o dobro de modo provisório. A energia também custa parte do tesouro recolhido e você deve voltar sempre que quiser superar um trecho complicado – é uma forma quase orgânica de Pepper Grinder colocar o jogador no controle da dificuldade.
Menos ou mais rotações por minuto
Por falar em dificuldade, saber pilotar a furadeira é obrigatório para avançar, pois a progressão é diversificada em mecânicas e escala consideravelmente, exigindo reflexos e coordenação. Os setores de plataformas, sejam perfurantes ou não, são os mais agradáveis, mas Pepper Grinder tem ainda fases que imitam os barris da série Donkey Kong Country ou lutas sobre vagões. Estes últimos são um pouco frustrantes porque o jogo inunda a tela com adversários e devemos coordenar a batalha com desviar de placas e obstáculos sem cair nos trilhos.
Contudo, Pepper Grinder tem em seu menu de opções configurações de acessibilidades bem-vindas. Eu as usei quando vi que o desafio estava acima da minha vontade de sofrer, embora possa ter relutado um pouco e insistido em pontos hostis. Para acessá-lo, basta pausar a qualquer momento para ativar e alterar, por exemplo, a velocidade do jogo ou o comportamento de botões que devem ser apertados rápida e repetidamente. Outras alternativas incluem a intensidade do tremor de de tela e da vibração do controle, além de ajustes sonoros.
Eu reduzi a velocidade do jogo e a ajustei de acordo – escolha que se mostrou certa. Não queria quebrar mais a cabeça em dois dos chefes – já falo deles, são poucos, mas ótimos! – e em partes cascudas, e o game que já estava incrível se transformou em extraordinário. A atenção aos detalhes, como a desaceleração dos sons que acompanham a velocidade do jogo, é de deixar a pessoa jogando embasbacada, entretanto o que sai da boca é um palavrão dos mais altos.
Como todo bom game, inimigos e chefes estão presentes e oferecem camadas novas ao desafio. Eles são inconvenientes durante as plataformas, obrigando-nos a reajustar rotas e acertar comandos, mas terão momentos para brilhar. A luta que comentei sobre os vagões de trens é um deles, enquanto a dificuldade estonteante está na variedade, pois os Narlings vêm em classes diferentes, algumas delas com capacetes, outras com espingardas, com espadas ou mais apetrechos.
Visuais retrô e sons de sintetizador no talo
Saindo das RPM do passado rumo aos FPS e BPM do presente, Pepper Grinder tem manual inspirado no Super Nintendo não por acaso, já que o próprio título parece ter sido feito como uma homenagem aos jogos da época. Uma homenagem dos anos 1990 com um filtro dos 2020, já que o game roda a 60 quadros por segundo no Nintendo Switch acompanhado de uma trilha sonora eletrizante. A força de uma “britadeira” se mede em octanagem? Torque? TORQUE? Posso usar torque para a trilha sonora?
Sim, os gráficos de Pepper Grinder se parecem mais com uma pixel art moderna que aqueles vistos nos consoles da quarta geração, que tinham lá seus sprites elaborados e até mesmo renderizados em programas 3D. Mas devo dizer que essa pixel art foi feita com maestria. Pra começo de conversa, o ótimo contraste nos faz saber o que estamos vendo no meio da intensa movimentação. Os temas dos mundos apresentam variação, mas o desenho de personagens e suas respectivas animações são extraordinárias – tente olhar atentamente para as expressões faciais criadas com poucos pixels.
Os Narlings são engraçados e vistos em diversas situações, uma delas dormindo por aí; sua líder é imponente e de antemão, só pela linguagem corporal, você já sabe que vai passar um suadouro quando for hora de enfrentá-la. Explosivos piscam para alertar o jogador, assim como Pepper após tomar dano. Não há confusão visual e, quanto a direção artística, é um trabalho belíssimo.
O mesmo para a trilha sonora eletrônica composta por XEECEE, que faz uso pesado de sintetizadores. Os filtros de volume e distorções mudam com as circunstâncias e os temas ganham intensidade quando, por exemplo, ação fica mais agressiva.
Vale a pena jogar Pepper Grinder?
A melhor descrição para Pepper Grinder seria dizer que é um jogo dos anos 1990 com esteroides e a capacidade dos jogos indies dos 2020. O título tem estética vibrante, trilha sonora contagiante e jogabilidade viciante – características que somadas vão transportar jogadores para a era nostálgica de plataformas 2D, mas com um toque de inovação e frescor. O conceito original da furadeira Grinder, que permite explorar o mundo de forma única, exige reflexos, é às vezes uma arma ou uma ferramenta polivalente que eleva a experiência.
Se você busca nostalgia, diversão e desafio, Pepper Grinder é a escolha perfeita. A ilha é um micromundo curtinho, talvez dure entre 4 e 7 horas dependendo de sua experiência e da vontade em marcar o 100%, mas ainda assim é exuberante. Contudo, me soa justo pelo preço atual de lançamento. E não sei se é pra dizer “infelizmente”, mas a aventura de Pepper me deixou com gostinho de quero mais.
Seja você um jogador experiente ou um novato no gênero, Pepper Grinder é um ótimo jogo, feito com precisão em todos os critérios técnicos que eu poderia avaliar e que ganha muitos pontos na minha subjetividade.
Pepper Grinder é digno de ser lembrado como um espetáculo visual, sonoro e de jogabilidade por capturar a essência dos jogos de plataforma do Super Nintendo com a velocidade e ritmo dos jogos atuais. O game chega hoje para Nintendo Switch e PC, via Steam.
*Review elaborada no Nintendo Switch, com código fornecido pela Devolver Digital.