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Someday You’ll Return | Review

Someday You’ll Return é, sem sombra de dúvidas, o jogo mais difícil que joguei em toda a minha vida. Feito para PC, via Steam, por apenas por duas pessoas, Jan Kavan e Lukas Medev, criadores da CBE Software, o jogo de terror psicológico é uma mistura de diversos elementos e chama bastante a atenção por criar um ambiente enorme e extremamente complexo para um jogo feito por apenas dois desenvolvedores.

Nesta análise em especial, abordarei a minha viagem em uma República Tcheca de mitos e lendas, paisagens estonteantes e diversas questões sobre o passado, o presente e o futuro. Porém, não trarei spoiler algum. Aliás, e bom deixar claro que toda atitude tomada dentro do jogo guia seus caminhos. Inclusive, em conversa com um dos desenvolvedores, Jan Kavan, via Twitter, descobri que o título pode ter até seis finais distintos. Enfim, sem mais delongas, vamos ao que interessa!

A história por trás de Someday You’ll Return

Someday You’ll Return é, basicamente, um jogo de terror psicológico dirigido por narrativas. Nele, você encontrará diversos conceitos íntimos de paternidade, medos, mentiras e uma forte recusa em aceitar o passado. Como Daniel, você terá a missão de procura sua filha desaparecida, Stela. Contudo, ao longo da busca, o protagonista terá de regressar a eventos e locais de seu passado, no qual ele prometia nunca mais voltar: as antigas florestas da Morávia.

Portanto, o jogo se passa em áreas reais da República Tcheca. Sendo assim, usa pontos de referência conhecidos para capturar a atmosfera de sua natureza estonteante. Aliás, ao longo da jornada, você pode acessar vários QR Codes para descobrir mais sobre cada um dos pontos visitados. O cenário típico de floresta tcheca cria um clima único para os jogadores, mesclando diversos tipos de vegetação, muitas rochas e monumentos esquecidos. Os locais e mitos mencionados durante toda a aventura são antigos, sendo alguns contos do século IX.

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As florestas da Morávia. Foto: Divulgação.

Uma viagem insana

O jogo é lindo. As paisagens da República Tcheca, luzes e sombras são muito bem elaboradas. Ao iniciar sua jornada em Someday You’ll Return, tudo parece simples e tranquilo. Em seus momentos iniciais, você praticamente aprenderá um pouco sobre como caminhar em florestas, escalar, etc. Sim, o jogo te fará andar bastante, contando apenas com seu smartphone e algumas outras ferramentas.

E nisso, você precisará ter MUITA atenção, pois certos detalhes pequeninos são de suma importância para dar prosseguimento ao jogo. Neste ponto, confesso que minha falta de aptidão com o gênero me deixou muito frustrado em inúmeros momentos. Mas eu sou insistente. Xinguei, fiquei nervoso, frustrado, cheguei até mesmo a mandar mensagem pra um dos desenvolvedores pedindo ajuda, mas consegui ultrapassar tudo. Foi um exercício de paciência e mais do que isso, de quebra de paradigmas. Eu explico: Os jogos atuais geralmente são muito lineares e simplificados. Tudo é dado nas nossas mãos, e a experiência segue assim, sem atribulações. Em Someday You’ll Return, as coisas não são assim, embora o jogo tenha sua linearidade. Há dificuldade em todo o percurso, e tudo isso significa algo.

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O passado é constantemente revisitado em Someday You’ll Return. Foto: Divulgação.

A minha viagem pessoal

Eu tendo a dizer que um jogo, independente de como ele é feito, se é fácil ou não, tem uma capacidade impressionante de tocar os jogadores. E aqui não foi diferente. Aliás, foi um jogo bem tocante. Ao longo da aventura, ele meio que ia me dando a entender muitas coisas sobre mim mesmo. O bunker que eu adentrava, era a cabeça de Daniel, mas também a minha. Eu me questionava o tempo todo se conseguiria terminá-lo. Ficava nervoso, frustrado, me sentindo burro. E, se isso não é dizer algo sobre mim, o que será?

Mas não era só isso que me ocorria. O jogo trata questões muito específicas como paternidade, família, lar, relacionamentos, masculinidade tóxica e também sobre os medos íntimos que todos temos. E esses assuntos estão (felizmente) cada vez mais presentes na indústria dos jogos. Em vários momentos, me senti incomodado com Daniel e suas ações arrogantes. Ele é um idiota, mas a jornada diz muito da sua possibilidade de redenção. Rever os erros e, mais do que isso, entender que o passado pode deixar marcas eternas tanto em nós mesmos, quanto em quem convivemos e dizemos amar.

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Não espere que tudo seja lindo o tempo todo… Foto: Divulgação.

Em suma, posso dizer que o jogo me tocou de inúmeras maneiras, de forma que eu achei isso tão relevante, que achei válido compartilhar com vocês. Contudo, certamente outras pessoas podem não perceber ou não se importar muito com isso. Enfim, a jornada pra mim foi exaustiva, sim, não vou mentir quanto a isso. Porém, foi recompensadora, mesmo com um final meio aquém do que eu esperava.

A jogabilidade e suas mecânicas

Pois bem, vamos falar agora dos aspectos técnicos de Someday You’ll Return. Durante todo o percurso, você terá de lidar com as mecânicas do jogo que consistem em construir e criar objetos, manejar ervas e criar poções para passar por determinados obstáculos, escalar montanhas e andar muito. Além disso, você irá interagir, através de seu smartphone (muito guerreiro, por sinal), com diversos personagens, seja por ligação ou mensagens de texto. Neste ponto, o jogo busca aprofundar mais nas histórias, o que é enriquecedor. Outra mecânica interessante, que vai ser apresentada durante a narrativa, é o uso de um totem mágico que levanta algumas pedras que fecham algum caminho e até consegue retardar temporariamente alguns inimigos. Aliás, tudo é bem explicado e fica visível no diário do protagonista.

O game segue uma certa linearidade, mas em diversos momentos confesso ter tido dificuldades de achar o próximo local para continuar a jornada. Mas confesso que não sei se é minha inaptidão para o estilo de jogo ou se realmente era difícil. Fica aí a questão. De toda forma, ele continha alguns bugs que travavam o prosseguimento da narrativa, algo que me obrigava a recarregar do último ponto salvo. Isso também foi ruim demais, mas é algo corriqueiro, sobretudo em um jogo feito por duas pessoas. Aliás, em breve um pacote de atualizações deve sair, o que é excelente.

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Bonito e… macabro! Foto: Divulgação.

Pra mim, o que foi frustrante no geral, foi a longevidade da aventura, que me soou meio forçada. Para se ter uma ideia, joguei cerca de 20 horas para concluir a tarefa. Contudo, os diálogos não foram a maior parte, e isso me frustrou um pouco. Embora a história seja profunda e forte, em alguns momentos ela some. Daí, o jogo se resume a subir montanhas, andar, pegar um ou outro item e desviar de monstros, já que não há combate aqui. Desta forma, o título certamente pode não agradar a todos os jogadores.

Gráficos e sons

Feito na conhecida Unreal Engine, Someday You’ll Return conta com gráficos estonteantes. A floresta é maravilhosamente bem feita, cheia de detalhes e conta com um sistema de iluminação que torna a experiência ainda mais imersiva. Já os bunkers e lugares por onde nos esgueiramos, conseguem captar toda a frieza das construções em concreto, além de, claro, trazer uma sensação de claustrofobia. Vale ressaltar também a maravilhosa trilha sonora que, infelizmente, é curta e pouco utilizada ao longo do jogo.

Os sons da floresta são extremamente relaxantes. E, ao contrário, os sons dos momentos de tensão trazem uma sensação de ansiedade ao jogador, que espera aflito no próximo ato. Nesse ponto, o jogo usa e abusa da atividade sonora para mexer com a cabeça dos jogadores. Porém, por mais que eu tenha me simpatizado com a voz de Daniel, parece que a narração poderia ser um pouco mais polida. Em alguns momentos, os áudios de reação são repetidos, algo que poderia ter sido mais explorado. Aliás, esses mesmos áudios podiam dar mais dicas de onde ir ou como fazer para passar pelos quebra-cabeças.

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Alguns personagens aparecerão na trajetória. Serão eles reais? Foto: Divulgação.

Vale a pena comprar Someday You’ll Return?

Someday You’ll Return certamente não agradará a todos. Mesmo tendo uma história rica e gráficos e sons muito bem elaborados, o jogo parece se delongar demais, algo que em diversos momentos torna-se muito frustrante e desesperador. Mas, talvez isso também ocorra pela tal “facilidade” que citei mais acima nos games em geral. De qualquer maneira, o trabalho dos desenvolvedores da CBE Software deve ser exaltado, sobretudo por criarem um título desta magnitude, que não fica atrás de títulos AAA. Mas, como eu disse, muitas coisas irão incomodar para além do decorrer do jogo. Para além disso, os variados bugs que me fizeram voltar em diversos momentos, podem ser um problema maior para outros jogadores.

Someday You’ll Return é um jogo para se curtir com bastante calma e sem pressa alguma. Mas estejam avisados de que a aventura é difícil e, em muitos momentos pode frustrar os jogadores com algum erro ou uma sequência extremamente delongada de caminhadas e escaladas ou em busca de alguma forma de resolver os variados quebra-cabeças. Além disso, o game é todo em inglês, o que pode ser um grande problema. Em conclusão, vale a pena sim, se você for fã do gênero e gostar de quebrar a cabeça. Caso contrário, siga no seu usual mesmo, como quem não quer nada…

*Review elaborada no PC, com código fornecido pela desenvolvedora.

Someday You'll Return

7.5

História

8.4/10

Gráficos e sons

8.4/10

Jogabilidade

6.5/10

Extras

6.5/10

Prós

  • Gráficos excelentes
  • História intrigante
  • Uma experiência diferente

Contras

  • Jogabilidade pode ser frustrante
  • Muitos bugs na versão testada
  • Em alguns momentos parece prolongado demais
  • O título não é traduzido para o português

Álvaro Saluan

Historiador e cientista social de formação, é completamente apaixonado por videogames e escreve sobre o tema há uns bons anos. Vê os jogos para além do entretenimento, considerando todo o processo como uma grande e diversificada arte.