Beyond Good & Evil 20th Anniversary Edition | Review

Há vinte anos, as primeiras frases ouvidas pelos jogadores em Beyond Good & Evil convocavam os cidadãos do paradisíaco planeta Hillys para a resistência. As telas mostravam um general das Seções Alfa, em uma armadura preta, e seu discurso reverberava por toda parte. “Leais Hillyans, a guerra voltou a se manifestar em nosso planeta. Com a ajuda dos traidores da Rede IRIS, nossos inimigos – os DomZ – romperam nossas fronteiras protetoras e se infiltraram na cidade.”

Repentinamente, um ataque surpresa dos DomZ atinge o farol onde Jade, uma repórter fotojornalista, vive. Enquanto corre para proteger as crianças e tenta ativar o escudo, ela recebe uma mensagem sem remetente com uma oferta de trabalho suspeita: visitar as minas abandonadas e fotografar evidências para trazer à tona a farsa das Seções Alfa, uma milícia que estaria aliada com os DomZ, uma misteriosa raça de alienígenas invasores.

De volta para 2024, a Ubisoft acaba de relançá-lo na forma de Beyond Good & Evil – 20th Anniversary Edition – uma versão aprimorada e com conteúdo adicional que promete conectar a história clássica com a sequência, que está eternamente em desenvolvimento. Nos computadores, o título está disponível via Steam, Ubisoft e Amazon Luna. Enquanto praticamente todos os consoles atuais o recebem em suas lojas digitais – PlayStation 5, PlayStation 4, Xbox Series X|S, Xbox One e Nintendo Switch.

Será que a odisseia de Jade segue relevante? Ou seria melhor que a Ubisoft a tivesse deixado intocada para manter o foco e concluir a continuação? É o que veremos agora, em mais uma review do Pizza Fria!

Pelas lentes da nostalgia: Beyond Good & Evil – 20th Anniversary Edition 

A esta altura, você provavelmente já sabe que Beyond Good & Evil foi um fracasso comercial na época de seu lançamento para Nintendo Gamecube, PlayStation 2 e Xbox, no longínquo 2003. Não dá pra saber ao certo o que aconteceu, já que a crítica abraçou o título com carinho e a era foi um dos momentos mais prolíficos e criativos de uma Ubisoft que ainda era um esboço do nome colossal de hoje.

Pode ser que os esforços de marketing tenham ficado abaixo do necessário, some isso com a concorrência pesada de Grand Theft Auto: Vice City e a espera de The Legend of Zelda: The Wind Waker.

Seja como for, essa então nova IP com uma protagonista feminina – que não era uma guerreira, só uma fotojornalista – foi uma ideia da cabeça de Michel Ancel, o nome por trás de Rayman. E, até hoje, Beyond Good & Evil é sua obra-prima – uma história envolvente e memorável, capaz de quebrar clichês e de misturar gêneros diferentes num único pacote.

Beyond Good & Evil 20th Anniversary Edition
Beyond Good & Evil tem mais que belos visuais, tem um ritmo próprio. (Imagem: Reprodução, Xbox Series S, modo qualidade)

A aventura de Jade incendeia uma revolução

A história começa de forma simples. Jade, uma jovem fotógrafa freelance, vive em Hillys, um planeta em guerra contra os DomZ e “protegido” pelas Seções Alfa. Criada por seu tio Pey’j, um porco falante, Jade cuida de órfãos de guerra em um farol cercado pelo mar de Hillys. Após um ataque dos DomZ ao farol, a rede IRIS recruta Jade para um trabalho, e logo percebemos que a resistência acredita que as Seções Alfa usam a invasão como pretexto para sequestrar os habitantes em nome dos DomZ.

Reticente, Jade precisa do dinheiro para pagar a conta de luz e manter o escudo ativo. Assim, para garantir a segurança dos órfãos, ela aceita um primeiro trabalho: fotografar uma espécie invasora de animais, trazida pelos DomZ. Ao final do que seria uma missão simples, ela se vê no meio de uma grande conspiração.

As pautas para a Rede IRIS viram notícias que serão espalhadas para a população local na forma de folhetos da resistência, e Jade é a repórter que viaja pelo planeta com a missão de conseguir provas fotográficas. Contudo, antes de conseguir cada clique, ela terá que desviar de perigos e construir credibilidade.

Beyond Good & Evil 20th Anniversary Edition
A dublagem é excelente e tudo pode ser acompanhado com as legendas em português. (Imagem: Reprodução, Xbox Series S, modo qualidade)

Desta forma, Jade assume o pseudônimo de Shauni, e com a ajuda de pessoas em altos escalões do governo, entrará em fortalezas protegidas pelas Seções Alfa. Acontece que Shauni não é uma lutadora nata e boa parte da jogabilidade envolve se esgueirar sem ser vista em lugares que lembram os templos da série Zelda, nos quais devemos solucionar quebra-cabeças para seguir adiante.

Além de ser sorrateira, nossa protagonista conta com a ajuda de um bastão para quando precisar se defender ou mesmo atirar – sim, o bastão dispara discos de energia, acerta inimigos a distância e move objetos no cenário.

Por outro lado, ela sempre estará acompanhada pela força bruta do próprio tio e, mais tarde, de um agente da Rede IRIS de codinome Duplo-H. Respectivamente, nossos parceiros contam com um alicate para cortar grades e uma investida destruidora de paredes! 

Beyond Good & Evil 20th Anniversary Edition
Viaje por Hillys no seu aerobarco… (Imagem: Reprodução, Xbox Series S, modo qualidade)

E assim, do início ao fim, Shauni viaja belas paisagens e se infiltra em instalações, tirando fotos das conspirações para a IRIS, brincando com furtividade e quebra-cabeça, um pouco de luta e sessões simples de plataformas que preservam uma narrativa de tensão crescente.

Ah! Para chegar de um lugar a outro, Jade navega pelos mares de Hillys em um hovercraft (aerobarco, como ficou na tradução), visitando também desafios variados além dos labirintos, como corridas e lojas com melhorias.

Hillys, o belíssimo e ainda impressionante mundo de Beyond Good & Evil é pequeno, mas detalhado e coerente para se navegar. 

Porém, Beyond Good & Evil – 20th Anniversary Edition guarda algumas surpresas na manga: a Ubisoft adicionou conteúdo à história que serve como ponte para o lançamento de Beyond Good & Evil 2 – quando quer que isso aconteça.

Beyond Good & Evil 20th Anniversary Edition
A câmera e suas fotografias serão suas principais armas em Beyond Good & Evil. (Imagem: Reprodução, Xbox Series S, modo qualidade)

Este trecho busca costurar uma emotiva história na reta final da aventura numa burocrática fetch quest (uma daquelas missões em que objetos devem ser recuperados e trazidos de volta ao ponto de partida ou levados a outro lugar, e a outro lugar, e assim por diante)

Ainda assim, ela traz novidades e game nos dá a chance de seguir um caminho opcional no qual recolhemos objetos pessoais da família de Jade em baús espalhados por todo Hillys na tentativa de criar motivação com muito apelo nostálgico de uma tripulação rebelde em busca de exílio galático – destoa, sim, do resto da narrativa, mas conta mais do passado da nossa protagonista e introduz protagonistas da prequela. Basta saber agora quanto tempo devemos esperar para Beyond Good & Evil 2.

Deu pra perceber que a câmera de Shauni, o pseudônimo de Jade para assinar matérias nos jornais da IRIS, é crucial para a mecânica do jogo, né? Ela conta com um zoom digital e será com cliques, mais que disparos, que a revolução começa. Os controles refletem ainda aqueles do jogo original, portanto a experiência pode parecer um tanto bruta para jogadores mais novos ou mesmo pra quem não teve contato com o título.

Eu mesmo estranhei e me dei ao luxo de tomar um tempo e inverter eixos e calibrar a sensibilidade dos analógicos em diferentes opções para câmera do jogo e hovercraft. Por falar em câmera, a do controle mesmo, essa provavelmente será sua pior inimiga. Tenha paciência e mapeie os botões como for mais conveniente que vale a pena (spoiler alert).

Beyond Good & Evil 20th Anniversary Edition
Poucos jogos podem se gabar de tantos lugares memoráveis. Mas o que a imagem não conta é a música porradeira do bar. (Imagem: Reprodução, Xbox Series S, modo qualidade)

Voltando aos cliques, as recompensas vêm quase sempre graças ao seu trabalho, já que ganhamos pérolas por cada álbum de criaturas, por serviços prestados, ou mesmo apostadas clandestinamente nas muitas missões secundárias, como vencendo corridas, saqueando cavernas de tesouros ou apostando no hockey de mesa contra um tubarão.

Entre outras coisas, essas pérolas serão muito úteis para comprar melhorias para seu hovercraft e para termos um registro do que Jade fez.

Quando Jade não estiver empunhando a sua perigosa lente, quebra-cabeças muito bem-bolados ganham os holofotes, exigindo de jogadores atenção em todos os cantos e uso de todas as habilidades do inventário – especialmente quando devemos investigar objetos de pertinho em busca de pistas e de códigos secretos.

Beyond Good & Evil 20th Anniversary Edition
Visite o farol, fotografe a fauna do planeta, passeie e se aventure. (Imagem: Reprodução, Xbox Series S, modo qualidade)

Novidades ainda que tardias

Visualmente, Beyond Good & Evil continua impressionante. Os modelos são os mesmos da remasterização de 2011, mas a excelente direção de arte já fazia desta versão um espetáculo visual. Nesta edição de 20 anos, vemos melhorias em vários aspectos. Hillys é lindamente renderizado, com personagens emotivos e animações precisas. O que realmente se destaca são as texturas de alta definição e o motor gráfico otimizado.

O cenário está mais prismático que nunca porque o sistema de iluminação recebeu aperfeiçoamentos, deixando visuais coloridos ainda mais bonitos. Acho que prismático é a palavra para a quantidade de cores em harmonia que vemos. O mar e a luz já eram maravilhosos lá atrás, e agora estão fantásticas mesmo com modelos mais antigos, pois o game roda a 60 quadros por segundo no modo desempenho e a estáveis 30 no modo qualidade (como joguei a maior parte).

Beyond Good & Evil 20th Anniversary Edition
O combate também tem seu espaço: Jade navega furtivamente e enfrenta inimigos com seu cajado. (Imagem: Reprodução, Xbox Series S, modo qualidade)

Você vê e sabe que o jogo não foi refeito. Contudo, a paleta de cores, o estilo e o modelado do elenco, as referências culturais através de cores, arquitetura, músicas e diálogos falados – todos em inglês e com legendas em português do Brasil – dão mais que personalidade a Beyond Good & Evil: transmitem a sensação de vida naquele mundo.

Por falar em músicas e sons, a trilha sonora complementa perfeitamente a atmosfera, variando de melancólica a animada, e foi reorquestrada para esta edição. Os NPCs, mesmo os secundários, são cativantes e contribuem para toda a riqueza – da garagem suspeita por irmãos rinocerontes jamaicanos às lojas nos guetos da cidade.

Além disso, quem estiver mais animado por revisitar o game, pode começar o Modo Speedrun para, obviamente, tentar o menor tempo possível e deixar a marca num placar de líderes online. Por fim, a edição recebeu um acervo com esboços inéditos da produção do game (que ainda quero mergulhar com a devida atenção).

Beyond Good & Evil 20th Anniversary Edition
A revolução vai ser televisionada, sim! (Imagem: Reprodução, Xbox Series S, modo qualidade)

Vale a pena jogar Beyond Good & Evil – 20th Anniversary Edition?

Sempre recomendei e continuei recomendando a fantástica aventura de Jade. Na época, com a cabeça a mil por muitos dos seus temas, vivia empolgado enquanto esperava por uma continuação.

Hoje, vejo que a verdadeira força de Beyond Good & Evil vai muito além da aglutinação graciosa de seus excelentes visuais, maravilhosas composições cinematográficas e forte narrativa, pois o game foi profético na construção de seu mundo, em retratar muitas dinâmicas reais com a leveza de uma fábula digital.

E, para dizer um pouco mais do que isso, era maravilhoso disparar cliques da câmera mais que disparos, sentir urgência em ver o bem-estar de amigos e de re-explorar nossos lugares favoritos em tempos melhores. O final, aquele com um gancho ENORME, me fez comprar um Xbox 360 esperando pela continuação. Sigo esperando. Para mim, Beyond Good & Evil sempre será uma das jornadas inesquecíveis num videogame. Com o preço abaixo de 100 reais, eu diria que é indispensável para todo mundo que quer viver uma aventura.

Beyond Good & Evil – 20th Anniversary Edition foi lançado no dia 25 de junho para PlayStation 5, PlayStation 4, Xbox Series X|S, Xbox One, Nintendo Switch e PC, via Ubisoft Store, Epic Games Store e Steam.

*Review elaborada em um Xbox Series S, com código fornecido pela Ubisoft.

Beyond Good & Evil - 20th Anniversary Edition 

R$ 99,95
8.3

História

10.0/10

Visuais

8.5/10

Sons

10.0/10

Jogabilidade

7.0/10

Dificuldade

6.0/10

Prós

  • Direção artística atemporal para visuais
  • Temas musicais de cinema e faixas orquestradas
  • Elenco carismático e dublagem
  • Legendado em português do Brasil
  • A narrativa cola um jogo muito vivo e único

Contras

  • Controles brutos mostram a idade do game
  • A câmera merece um apartado especial

Carlos Maestre

Jornalista que passou a pesquisar acessibilidade digital pela constante necessidade de inverter o eixo Y - desde GoldenEye 007. Cresceu com a Nintendo e fã da (atual) Microsoft, quer a velha Rare de volta. Além de achar divertido caçar conquistas, sofrerá uma intervenção a qualquer instante por culpa de Stardew Valley.