Lessaria | Review
Entre tavernas, castelos e heróis autônomos bem complicados, Lessaria tenta reviver uma já esquecida era de ouro dos RTS automatizados. Desenvolvido pela Rockbee e distribuído pela Polden Publishing, o jogo já está disponível para PC via Steam, prometendo ser uma homenagem ao clássico Majesty, trazendo a sensação de comandar um reino sem necessariamente comandar os súditos. É uma proposta meio curiosa: um simulador que nos coloca no papel de um monarca que deve gerenciar economia, expandir território e inspirar heróis, mas sem nunca dar uma ordem direta.
O conceito, por si só, é incomum. Num cenário dominado por RTS tradicionais e títulos de gerenciamento urbano, ver um jogo como esse reaparecer causa até um certo estranhamento. Afinal, atualmente, os jogos de estratégia em tempo real fazem questão de nos colocar no controle total, algo que, a meu ver, faz todo o sentido. De qualquer forma, será que Lessaria é um bom jogo, ou apenas revive uma velha fórmula que já teve sucesso um dia? Falaremos sobre isso e muito mais nesta review!
Uma ideia clássica
Lessaria é um RTS que tenta ser algo bem próximo do que foi Majesty nos anos 2000. O jogo aposta em uma mistura de estratégia e simulação de reino, em que cada missão funciona como conto paralelo. Sua campanha é estruturada em capítulos independentes, com objetivos variados como defender o castelo, explorar áreas novas, eliminar chefes ou simplesmente sobreviver a ondas de inimigos. A ideia de apresentar o modo história como uma coletânea de fábulas curtas é agradável e até funcional nas primeiras horas.
No entanto, esse charme inicial se esgota rapidamente. As missões se repetem com frequência, nos deixando com a sensação de estarmos presos num ciclo de déjà vu. Cada mapa começa da mesma forma: ergue-se um castelo, constroem-se madeireiras e pedreiras, contratam-se heróis e… repete-se o processo sempre. Mesmo com os eventos aleatórios e a mecânica de ameaças temporizadas, Lessaria parece incapaz de manter o frescor ou criar algo realmente memorável entre as fases. Mas calma… ainda tenho muito a falar.

Heróis mercenários que não agem de forma muito inteligente
O principal diferencial de Lessaria é justamente o de controle indireto dos heróis, que são mais como soldadinhos do que heróis mesmo. Aqui, não clicamos em cada unidade para mover ou atacar. Muito pelo contrário, somos obrigados a criar missões ao longo do mapa, definindo recompensas em ouro para os que desejarem executá-la. Obviamente, quanto maior o valor, maior o interesse dos heróis em executar a tarefa. O problema é que eles são meio tapados…
A ideia, herdada diretamente de Majesty, pode até parecer interessante, transformando a IA das unidades em protagonistas independentes, nos forçando a pensar como gestores de recursos. Na prática, porém, o que deveria ser um sistema de estratégia profunda acaba sendo frustrante. Os heróis agem de forma errática, ignoram missões e, às vezes, preferem beber na taverna enquanto a base é atacada. E o pior: quando decidem agir, muitas vezes o fazem da pior forma possível. É uma bagunça!

A inteligência artificial, que deveria ser a parte mais importante do jogo, parece precisar urgentemente de uma reeducação. Ao longo das partidas, acabei tentando compensar os erros da IA e construindo tantas coisas, que a experiência ficou massante. Ou seja, essa ideia de heróis autônomos não caiu bem, pelo menos para mim.
Mecânicas duvidosas
Se formos falar de estruturas e mecânicas, Lessaria até oferece uma certa variedade: há construções econômicas, guildas para recrutar diferentes tipos de heróis (guerreiros, magos, arqueiros e ladrões), além de um sistema de evolução que permite desbloquear habilidades e especializações. Mas o jogo rapidamente mostra suas limitações.
O problema começa logo na economia, que se mostra meio desequilibrada. O ouro, recurso essencial para tudo, desaparece de forma muito rápida. Como cada missão requer uma recompensa, acabamos vivendo em um constante dilema entre investir na infraestrutura do reino ou pagar os heróis para fazerem o mínimo. Em algumas partidas, confesso que me deu um desânimo absurdo de dar continuidade, seja por conta do ouro ou até mesmo devido a muitas funções para se fazer algo básico.

Mais surreal ainda é quando os heróis decidem agir por conta própria e, simplesmente, se embrenham em lugares com inimigos de nível alto, sendo praticamente uma tática suicida. Agora, imagine só lidar com diversos heróis de nível de inteligência artificial extremamente duvidosa, gerir questões econômicas e lidar com as hordas que atacam de tempos em tempos? Pois é, nesse quesito, Lessaria dá uma viajada legal…
Pior ainda é que o jogo tenta criar um sistema de progressão de cada herói, como se cada um deles tivessem detalhes únicos, algo que passa totalmente batido. O que acaba acontecendo em alguns casos é que eles comecem a ter medo de monstros específicos, fiquem soberbos ou simplesmente saiam andando sem rumo pelo mapa. É algo meio difícil de se explicar, confesso. As decisões de cada um deles são aleatórias e, em boa parte do jogo, nem o ouro os motiva a agir conforme desejamos.

Um jogo modesto
No quesito visual, Lessaria tenta capturar um estilo meio retrô que remete aos RTS clássicos. O problema é que, essa tentativa de homenagem é frustrante, se perdendo em texturas inconsistentes e modelos simplórios. Os menus, por exemplo, parecem ser feitos por um designer caseiro. Ainda que algumas áreas sejam bem trabalhadas, o que senti em Lessaria é que boa parte do jogo parece inacabado, com elementos visuais que se repetem demasiadamente. O resultado é um mundo sem graça, sem personalidade, errando o nostálgico e mirando no simplista.
As animações são outro ponto bem fraco. Personagens se movem para lá e para cá de forma travada, e os combates parecem cenas de marionetes se batendo, algo bem estranho. Quando o caos se instala, aglomerando múltiplos heróis, monstros e efeitos mágicos na tela, o jogo vira uma grande bagunça. O áudio, por sua vez, segue nesse padrão. A trilha sonora é um pouco repetitiva, mas traz uma voz off com um narrador, tal como em Majesty. Agora, sim, Lessaria adiciona lá uma pitadadinha de nostalgia genuína.

Sinceramente, posso estar sendo um pouco extremo, mas esse estilo de RTS parece já não caber mais na atualidade. Bem, pelo menos não desta forma. Por conta disso, Lessaria até tenta emplacar ideias boas, mas acaba esbarrando em um simplismo que desagrada. É um jogo de gráficos e sons simples, premissa exagerada e inteligência artificial desconcertante. Por essas e outras, prefiro eu mesmo controlar cada um dos meus peões…
Vale a pena jogar Lessaria?
Sendo bem honesto, Lessaria é aquele jogo que você vê o trailer e imagina logo algo grandioso e bonito à primeira vista. No entanto, logo no começo, ao acessar o menu introdutório, a ilusão se dissipa, dando espaço para a frustração. É claro, há ideias boas no jogo, alguns poucos momentos de diversão e até lampejos de genialidade, mas eles se perdem em meio a uma série de falhas estruturais, repetição e uma IA que mais atrapalha do que ajuda.
Os gráficos não são chamativos e a ideia de homenagear um gênero esquecido parece mais uma tentativa de voltar a um passado do que a de incorporar a nostalgia em algo novo e até mesmo mais atualizado. No fim, o que sobra é uma experiência bem morna que serve mais como curiosidade histórica do que como um título indispensável.
Se você for um fã nostálgico incurável de Majesty, daqueles que viravam noites nos anos 2000 jogando, aí, sim, a ideia de jogar Lessaria pode ser boa, mas com paciência e boa vontade para ignorar parte dos erros. Para todos os outros, é melhor pular fora ou escolher outro reino para explorar.
*Review elaborada em um PC, equipado com uma GeForce RTX, com código fornecido pela Polden Publishing.


