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A franquia Metal Gear e suas críticas contra as guerras

A obra de Hideo Kojima é, sem dúvidas, uma das mais icônicas dos videogames. Especificamente, a franquia Metal Gear vai muito além de uma história sobre robôs gigantes e super soldados especializados em infiltração e suas caixas de papelão. Toda a trama de Metal Gear é feita justamente ao redor de reflexões e momentos históricos reais, mas com um toque japoneses. Toda a narrativa da tão amada franquia de Kojima (e que já está precisando de um remake, vale ressaltar) é realmente confusa e complexa, com uma cronologia misturada que acompanhou o desenvolvimento dos jogos eletrônicos, sendo constantemente impactada por isso.

Verdade seja dita, quando o primeiro Metal Gear saiu para MSX, em 1987, Kojima claramente não tinha todo o enredo em mente. Entre Big Boss, Solid Snake, Raiden e tantos outros personagens, muita coisa aconteceu, e em períodos históricos diferentes. Mas a questão aqui ficará mais restrita ao período da pós-Segunda Guerra Mundial, conhecido como Guerra Fria, coberto de forma fictícia por títulos como Metal Gear Solid: Peace Walker e Metal Gear Solid V: The Phantom Pain. Neste último em especial, temos um nítido alerta contra as armas nucleares e a própria indústria da guerra.

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Punished Venom Snake e companhia em Metal Gear Solid V: The Phantom Pain. (Imagem: Reprodução)

E bem, não preciso dizer muito sobre o momento atual, onde todo o mundo está apreensivo com a possibilidade de uma guerra em larga escala e possivelmente nuclear. Neste ponto, vale ressaltar que o conflito entre Rússia e Ucrânia é só mais um na atualidade, pois diversas regiões do mundo ainda sofrem com tensões geopolíticas – algo que Kojima também trata em alguns jogos. Mas, aos olhos da mídia ocidental, o restante pouco importa. Afinal, quem liga quando há um ou cem conflitos na África ou quando os EUA invadem mais uma vez algum território pela “paz e democracia” (leia-se petróleo e influência política) não é mesmo (contém ironia)?

Salvando o mundo das armas nucleares em Metal Gear Solid V: The Phantom Pain

Resumidamente, mas sem spoilers, Metal Gear Solid V: The Phantom Pain aborda ao longo de sua narrativa uma série de questões como idiomas, etnias e povos distintos, a tensão entre União Soviética x o mundo capitalista (leia-se EUA), crianças-soldado e armamentos nucleares. Aliás, o mote do jogo no modo multiplayer era desativar todos os armamentos nucleares do mundo. Inclusive, esta missão foi concluída com sucesso pelos jogadores, rendendo a icônica cutscene abaixo:

Diante deste cenário atual (a invasão da Ucrânia pela Rússia), onde a discussão sobre armamentos nucleares volta como pauta internacional, Metal Gear surge como uma forma de reflexão já há muito preconizada por Hideo Kojima. Visionário? Realmente, ele é uma homem à frente de seu tempo, mas a questão nuclear não chega a ser novidade para nós, sobretudo se conhecermos o mínimo da história mundial e como os seres humanos conseguem ser cada vez mais predatórios e sedentos por poder. A ficção só faz o papel de levantar as hipóteses de forma a nos alertar, causar incômodos, reflexões e até mesmo em divertir. Afinal de contas, a arte serve para isso – e muito mais.

Jogos são políticos SIM

Jogos são políticos. Uns mais, outros menos, mas acabam sempre por refletir parte das opiniões de quem está por trás do desenvolvimento. Não, não estou misturando política com seus jogos ou tirando isso da cabeça. Jogos são sim políticos e temos uma infinidade de exemplos por aí. Battlefield, Call of Duty e tantos outros que o digam…

Mas voltando ao nosso foco, como disse acima, a narrativa de Metal Gear em especial segue bem de perto os principais eventos históricos do século XX, Guerras Mundiais, o Projeto Manhattan e a Guerra Fria, período em que ocorreu de forma abrangente a questão da proliferação nuclear. No entanto, vale ressaltar aqui que o único país a sofrer o ataque de um armamento desse naipe foi o… Japão. “Ironicamente”, o país de Kojima.

Fora isso, as ameaças de ataques e da existência de armamentos foi toda feita através de manobras e discursos políticos a nível global. Ainda assim, anos após os ataques a Hiroshima e Nagasaki, em 1945, a cultura japonesa ainda é muito afetada, sendo Metal Gear um dos vários exemplos.

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Uma das mensagens de Metal Gear Solid V: The Phantom Pain. (Imagem: Reprodução)

Porém, há um ponto interessante na política de Metal Gear: Kojima nunca cravou necessariamente um “culpado” ou “condenou” algum dos vários lados da história real. A obra de Kojima, de uma forma completamente singular, ousada e até mesmo confusa, trata todos os lados da narrativa, EUA, União Soviética, mercenários e tantos outros personagens e grupos envolvidos estão basicamente em constante competição pelo poder, onde cada um tem seus objetivos. Desta forma, cada um deles tem suas próprias razões para obter armas de destruição em massa, sendo este o mote que une todos os personagens.

Afinal, todos temos motivos para fazer algo, mas isso não significa estar certo ou errado. Inclusive, essa dicotomia não é nada simples para resumir um conflito, tal como temos visto com os comentaristas e especialistas de internet. Sim, a realidade é tão complexa quanto a obra de Kojima e não é resumida apenas em vilões e mocinhos. Há muito por trás do jogo de poder…

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Até o próprio Kojima aparece em Metal Gear Solid V: Ground Zeroes. (Imagem: Reprodução)

Robôs gigantes e nucleares

Com os armamentos nucleares desempenhando um papel central na narrativa de Metal Gear, a maneira como eles são retratados nos jogos é ainda mais interessante. Em cada título, independentemente do protagonista, o jogador está sempre tentando impedir que um antagonista destrua o planeta inteiro com uma dessas máquinas do fim do mundo. Seja o Shagohod, de Metal Gear Solid 3: Snake Eater ou o Sahelanthropus, de Metal Gear Solid 5: Phantom Pain, eles são projetados para serem uma grande arma de destruição, com o objetivo de garantir o monopólio da força ante o resto do mundo.

Porém, o conceito desses armamentos segue uma lógica muito nipônica. Basicamente, os Metal Gears são robôs munidos de armas nucleares. É isso. Honestamente nunca parei pra pensar no motivo que faz os japoneses amarem tanto robôs gigantes, mas confesso achar a ideia de Kojima um pouco engraçada, embora o resultado seja o contrário disso. A cada jogo, um novo Metal Gear surge com diferentes aspectos e na mão de um grupo distinto. É uma balança de poder, tal como a vida real.

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O gigantesco Metal Gear Sahelanthropus. (Imagem: Reprodução)

Na verdade, talvez Kojima tenha tido essa ideia para além do fascínio com robôs gigantes, sendo essa talvez uma forma de alívio cômico ou de simplesmente ter personagens com presença, poderosos. Afinal de contas, uma arma nuclear é uma arma nuclear em um avião, em uma bazuca ou em um robô de 24 metros.

Metal Gear e o sentido para guerras sem sentido

Metal Gear apresenta a guerra motivada por uma série de coisas, mas, ao mesmo tempo, uma guerra sem sentido. Aliás, a guerra só tem sentido para quem lucra com ela. Essa basicamente é a lógica: poder e dinheiro, tal como em quase tudo neste mundo, infelizmente. Parece ser patológico do homem, mas esse é um assunto muito complexo para se abordar aqui. Enfim, seja com Raiden, Big Boss (o verdadeiro) ou Solid Snake, a luta é sempre contra as armas nucleares. E elas, que deveriam ser motivação suficiente para findar as guerras, acabam sendo a plataforma de controle do conflito. A vida imita a arte ou a arte imita a vida?

A franquia Metal Gear, mesmo com seus exageros nitidamente criados para prender a atenção do público, faz um forte argumento contra a guerra, seja ela nuclear ou não. Ela aborda os riscos que a busca incessante pelo poder, todo o jogo político ao redor disso e como a humanidade simplesmente pode perecer com o apertar de um botão, ao mesmo tempo que também aborda a fragilidade dos homens mais poderosos.

*Texto baseado em Metal Gear Solid Makes a Strong Argument Against Nuclear War, de Bhromor Rahman, para o GameRant.com.

Álvaro Saluan

Historiador e cientista social de formação, é completamente apaixonado por videogames e escreve sobre o tema há uns bons anos. Vê os jogos para além do entretenimento, considerando todo o processo como uma grande e diversificada arte.