SkateBird | Review
Se SkateBird fosse um restaurante, provavelmente seria reconhecido por servir gastronomia fusão, ou fusion cuisine, como muitos falam, gastronomia que mistura elementos com origens nacionais, regionais e culturais completamente diferentes. O nome entrega que este é um jogo de passarinhos sobre skates.
Já pensou um Tony Hawk’s Pro Skater ou Skate só que com canarinhos coloridos sobre aqueles skates de dedo e com pistas feitas sob medida com objetos como cadernos, cadeiras e rolos de papel higiênico?
SkateBird é isso aí! Um jogo da desenvolvedora e editora independente Glass Bottom Games que chega a múltiplas plataformas: aos consoles Xbox e Nintendo Switch; ao serviço Amazon Luna; ao PC com macOS, Linux e Windows 10 por meio de Steam e Itch.
O jogo será lançado neste dia 16 de setembro de 2021 e também chega ao catálogo do Xbox Game Pass (para consoles Xbox One e Xbox Series X|S e computadores com Windows 10).
Daqui pra baixo você descobre na análise do Pizza Fria se vale a pena jogar SkateBird!
DISCLAMER!
Joguei SkateBird com o Nintendo Switch na doca, usando Joy-Cons, Pro Controller oficial e outro licenciado da PowerA. A experiência descrita foi a mesma.
Desenvolvido em Unity, SkateBird tem uma abertura bacana, uma ideia bacana, toneladas de personalização e de opções, mas falhou miseravelmente quando entrou em movimento.
A adaptação para o console da Nintendo ficou a cargo de Plastic Fern Studios e, a partir dessa bifurcação, não tenho certeza se os problemas aqui relatados são específicos do console ou se são compartilhados com a versão para computador.
Precisamos falar sobre SkateBird
Olha, eu sei que Tony Hawk’s Pro Skater 1+2 Remastered saiu, mas… eu gosto mesmo da franquia Skate, e sei muito bem, por um lado, por que queria fazer uma análise de SkateBird. Um novo jogo de skate é uma ótima ideia pra quem se sente órfão do gênero e que passou dos 30 com joelho e tornozelo avariados.
A estética zoeira de ter passarinhos com óculos e bonés ou chapéus de bruxo sobre fingerboards em parques de skate criados dentro da sala é um presentão, daqueles que a gente olha e ri só de ver, mesmo sem jogar.
Vamos lá, SkateBird era promissor!
Por outro lado, nem sempre a aposta se paga. Volta e meia me vejo em conversas com pessoas ligadas com games de alguma forma, sejam jornalistas, sejam jogadores ou entusiastas. Numa dessas conversas recentes, surgiu a infindável discussão sobre gráficos, ou som, ou história serem elementos mais importantes. Acho que até vi uma enquete sobre qual critério seria o importante.
Ironicamente, foi SkateBird responsável por deixar claro que o primeiro critério importante é a jogabilidade. E jogabilidade é um critério que pode ser amplo, então deixo minha pequena descrição. Assim, você e eu estaremos na mesma página.
Pra mim, jogabilidade diz respeito à qualidade dos controles e como sentimos o jogo em movimento e a navegação pelo cenário. Isso mistura uma parte mecânica e uma parte sensível que envolve nossa percepção: é a qualidade do mundo desenhado e quão natural ele é para a proposta do jogo. Jogabilidade é esse refino que nos dá prazer ao jogar com as mãos no controle; é quando os comandos na tela se tornam uma extensão natural do seu corpo, jamais truculenta.
SkateBird: burly nest fall
Eu só queria um jogo bacana de skate. Burly, no jargão do skate, é uma manobra de altíssimo risco que, se executada sem sucesso, causa ferimentos graves. “Burly nest fall” seria algo como “queda violenta do ninho” e é o nome que eu daria pra esta crítica e para a manobra fictícia.
A esta altura, você provavelmente já percebeu minha decepção. Agora, deixa explicar os por quês.
Entre as informações dadas pela guia para análise de SkateBird (sim, essas coisas existem), o jogo é colocado no gênero “um jogo de skateboarding sobre tentar fazer o seu melhor”. Escrito por Megan Fox (uma homônima da atriz e idealizadora do jogo), o material fala como este é o resultado de três anos de trabalho após uma outra tentativa falha.
Foi com a exibição na E3 2019 que o financiamento coletivo por Kickstarter para SkateBird começou a voar (perdão). Será que foi esse o começo da burly nest fall?
Uma missão, cinco fases
SkateBird começa com um conflito nada necessário para estimular a jogatina. Aparentemente os passarinhos se sentem abandonados porque o Amigão (“Big Friend”), o humano, não passa mais tempo em casa.
Ora, ora… qual seria a melhor maneira das aves chamarem a atenção senão organizando o quarto com a ajuda dos skates de dedo?
Por cinco fases, você descobrirá o que aconteceu e elaborará um plano com outros canários, araras e corujinhas para que o Amigão nunca mais volte ao escritório e fique mais tempo em casa.
O jogo não é demorado, umas sete horas para fazer tudo, incluindo encontrar todos os segredos. Existe até um sistema de Troféus/Conquistas integrado no Switch! O problema é a jogabilidade – aproveitando a deixa, vamos lá!
A jogabilidade em um jogo de skate: brilhar ou brilhar
As fases funcionam como micromundos. Elas têm layouts de alguma forma até interessantes para andar com seu carrinho e contêm segredos, um mecanismo clássico nos jogos do gênero.
Se THPS tinha as fitas VHS, SkateBird tem Mixtapes, além de vários estilos de roupas, decks e rodinhas coloridas.
Outro componente são as missões, que estão marcadas no minimapa pelos pontos dourados (obrigatórias) e azuis (opcionais em sua maioria) em uma pegada similar à da trilogia Skate, da EA Black Box.
Por falar em missões, temos as clássicas que esperamos em um jogo do tipo: recolha as letras M-O-N-E-Y (“dinheiro”) em ordem, salte um gap pelo cenário, faça um corrimão específico, recolha itens. Tudo dentro do tempo.
E até aí tudo bem.
Foi concluir a vasta personalização e… quando o controle era meu…
A desastrosa câmera já se fez presente. Bruta, sem suavidade alguma. Aceleração e frenagem são golpes na tela – tanto da câmera, quanto do canarinho. Por falar no canarinho…
Dificuldade é importante em jogos de skate, mas eu não me sentir manobrando um caminhão cegonha abarrotado de veículos pesados!
A regulagem padrão da barrinha de equilíbrio para um manual, por exemplo, é veloz demais. Felizmente, SkateBird apresenta muitas opções de acessibilidade e conta com pontos de checagem para resetar o personagem (mais uma vez, como em Skate) e reposicioná-lo.
Se você vencer a física do jogo, você passará algumas missões. E, sim, liguei assistências a rodo para sofrer menos.
Pessoalmente, prefiro o jeitão com dois analógicos de Skate para fazer todo tipo de manobra que a combinação de um botão com uma e direção. SkateBird meeeeeeeeeeio que segue esta segunda? Eu ainda não entendi como executar especificamente a manobra desejada.
No geral, temos um botão para Ollies (saltos), outro para Grabs (manobras com a prancha segurada), um terceiro para Flips (giros da prancha sem segurá-la) e um último para Grinds (para conectar com o corrimão).
A coisa mais legal em todo SkateBird é a inclusão de um salto duplo, já que nosso esportista alado deveria voar. Faça um ollie e aproveite a altura máxima para “saltar” novamente! O bater de asas garante altura e distância adicionais, além de um bem-vindo e merecido respiro pra nos afastar da jogabilidade travadona.
Para ser mais veloz, encaixe manobras consecutivas para preencher o medidor em formato de ovo com clara e gema e o escrito “Fancy” (em português, “chique”). Com a gema preenchida, o canário está na velocidade máxima e ganhará mais pontos, assim como atingir mais altura ao decolar de half pipes.
E apesar da falta de requinte geral, é bom ver que o time pensou nas opções e em vários critérios de acessibilidade.
Não só é possível configurar em detalhes os diversos volumes de música e de efeitos sonoros específicos (como de ambiente, piados, skate, interface), mas também escolhemos executar manobras automaticamente após um ollie, a velocidade na qual o jogo roda, o campo de visão da câmera e equilíbrio do skatista. São muitos critérios e liguei vários para facilitar a truculenta saga.
Outro elogio válido, mas que infelizmente não soluciona o problema basilar, é a facilidade de fazer transfers, de sair de um quarter pipe para o outro lado, por exemplo. Acho que é mais simples em SkateBird que em qualquer outro jogo sobre rodinhas.
Gráficos e sons
O material de divulgação é maravilhosamente ilustrado e divertido. Contudo, a ambição de fazer um jogo independente em três dimensões precisa, às vezes, ser dosada.
Os modelos poligonais são simples e as texturas são absurdamente genéricas – do pouco que sei modelar, o principal crime aqui é a falta de overlays, ou seja, as sobreposições para criar variedade visual e evitar uma repetição infinita.
Para entender melhor, imagine o seguinte exemplo: uma textura de carpete que, mesmo sem afastar a câmera, você nota a cópia constante e cansativa de uma ponta a outra. Se ao menos fossem colocadas algumas rusgas ou sujeitas, alguma coisa pra deixar tudo natural…
Inevitavelmente, todo o ambiente fica com uma carinha de inacabado.
Por outro lado, as fascinantes opções de personalização da ave são beeeeeem variadas. Todas compartilham o mesmo corpinho redondo de pombo obeso com uma camada de textura diferente. São canários de várias cores, corujas, araras, papagaios…
Ver a movimentação ágil e o bater de asinhas para ganhar impulso é divertido e aposto que um filtro cel shading consertaria as texturas insossas.
A trilha sonora, por outro lado, se revela o melhor aspecto de SkateBird, pois inclui músicas originais e licenciadas. No menu principal, jogadores ainda têm a chance de configurar suas respectivas playlists e, a cada fita cassete encontrada, novas músicas são liberadas.
Entre influências de estilos musicais, que os criadores chamaram de “bird-hop para andar de skate”, estão o rap, jazz, funk e até ska, para ressoar com a cultura atual.
Entretanto, as músicas licenciadas ficaram de fora do serviço Amazon Luna, ainda que os colecionáveis secretos ainda estejam espalhados pelas fases.
Por fim, vale ressaltar que a jornada é para um único jogador, sem qualquer modo multijogador local nem online.
Vale a pena jogar SkateBird?
Ultimamente adotei uma frase do poeta Walter Whitman como mantra – “Seja curioso, não crítico” – o que é engraçado porque o princípio fundamental destas análises é a crítica para informar você, como leitor, sobre um produto.
A ideia por trás da frase é sempre perguntar, “Por quê?”, antes de apontar dedos. Entender as diferenças ou falhas, para garantir que não passou nada, antes de atacar ou diminuir.
Tenho a certeza de que a Glass Bottom Games é um estúdio pequenino com punhado de gente envolvida e outros poucos colaboradores. Reforço que também não tenho noção se versões para computador e consoles Xbox têm desempenho igualmente trágico como do Switch.
Já que a precisão do controle e da fluidez impera quando se trata de jogos de esporte, ainda que sejam zoados, fica muito difícil de recomendar o jogo no estado atual – SkateBird foi um dos piores jogos que rodei no meu Switch.
Hora de voltar para OlliOllie: Switch Stance enquanto a continuação OlliOlli World não chega. Ou de começar minha carreira de game dev.
*Review elaborada em Nintendo Switch com código fornecido pela Glass Bottom Games.