BALL x PIT | Review
Tá aí, BALL x PIT é tão angustiante quanto viciante. Nunca pensei que o cruzamento improvável entre Arkanoid, Vampire Survivors e até aquelas propagandas enganosas de “Last Wars Survival” no YouTube pudesse resultar em algo tão divertido. Criação do programador veterano Kenny Sun com ajuda de alguns amigos e publicado pela sempre irreverente Devolver Digital, BALL x PIT chega para provar que o caos pode ser deliciosamente calculado.
O título é uma mistureba que traz em seu código genético os jogos citados acima, combinados dentro de um bullet hell com roguelite. Chegando neste 15 de outubro de 2025 para computadores (Steam), Nintendo Switch, PlayStation 5 e Xbox Series X|S, o jogo prende os jogadores na tentativa de sobreviver no fundo do poço de Nova Bolalônia.
Prometo que toda a carga referencial fica aqui na introdução e, até o fim desta análise para o Pizza Fria, deixo minhas impressões sobre BALL x PIT e tento explicar como este jogo funciona.
Análise de Ball x PIT
BALL x PIT
Joguei a versão para Nintendo Switch no meu Nintendo Switch 2, que ainda receberá uma versão específica em data futura. Antes de começar, fiz aquele passeio pelas opções e por lá encontrei, entre outras configurações, o idioma português do Brasil e a opção de mudar a fonte – escolhi uma tipografia mais legível em vez da padrão, que era estilizada em pixels finos. Afinal, tenho 40 anos e joguei a maior parte do tempo no modo portátil.
Também pude ajustar as inúmeras barras de volume, além de ativar e desativar animações excessivas na tela para diminuir incômodos por movimento.
A abertura de BALL x PIT é simples. Ela mostra uma estranha nave psicodélica se aproximando de uma torre espiralada… Então, aparecem os dizeres “Bolalônia caiu. Um poço é tudo que resta”. E, no lugar do que antes parecia ser uma próspera cidade em um belo vale, agora há um poço com um fundo impossível de enxergar.
O que era aquele estranho objeto? Uma nave espacial dourada? Um artefato místico gigante? Ou um castigo divino com estranho senso de humor, num paralelo com a história bíblica? Não importa… Seu objetivo maior no jogo é reconstruir a cidade, agora conhecida como Nova Bolalônia. Ao lado do colossal poço, alguém instalou um elevador gigante… “Agora, caçadores de tesouros se reúnem para explorar as profundezas…”
À primeira vista, a historieta não me pareceu ter muita carne (e não tem mesmo), mas foi suficiente para prender minha atenção. A tela seguinte já te coloca no tutorial, no controle do único personagem liberado – por enquanto –, “O Guerreiro”. É hora de explorar a primeira camada abaixo da terra e, para isso, o elevador te transporta até lá, no “O pátio x Ósseo”.

(Imagem: Reprodução / Carlos Maestre)
Guerra de trincheiras (jogabilidade 1)
Apesar da confusão inicial, BALL x PIT me fisgou rápido. Durante a explicação, O Guerreiro é colocado numa espécie de faixa de combate vertical que se move para baixo, como uma esteira. O personagem fica lá, dando seus passinhos sem sair da posição inicial. Contudo, o analógico esquerdo o desloca pelo terreno na área visível na tela, sem levar a câmera. Neste breve momento, O Guerreiro ainda dispara uma bola cheia de pregos, seguida por várias esferas brancas menores.
De repente, inimigos começam a cair na parte superior da arena. São esqueletos em caixotes e, como estão contidos, parecem inofensivos. À medida que essas bolotas brancas acertam os caixotes, números informam o dano causado. Como a trincheira funciona como uma esteira, os caixotes com esqueletos se aproximam lentamente da nossa direção.
Opa! Se esses caixotes chegarem inteiros à parte de baixo da tela, os esqueletos saltam sobre O Guerreiro e lhe arrancam vida. Algo similar acontece se você se aproximar demais de um inimigo; uma exclamação logo te avisa que ele está prestes a saltar sobre seu comandado.
O remédio é usar essas bolas disparadas para matar todos os inimigos no campo antes que eles cheguem ao fundo. Isso requer deslocar seu boneco com o analógico esquerdo, bem como usar o direito para mirar em qualquer ângulo, desde que seja para cima. As esferas são lançadas e vale usar o rebote entre inimigos e até entre inimigos e paredes para causar dano mais rapidamente.

(Imagem: Reprodução / Carlos Maestre)
E, a cada inimigo abatido, uma gema brilhante de experiência fica lá, esperando ser recolhida. Ela se move com o cenário-esteira, claro, e julgar se vale recolhê-la é por sua conta e risco. Ao adquirir experiência, você sobe de nível e a cada nível tem a chance de escolher uma de três cartas que contêm esferas especiais ou habilidades passivas.
Por exemplo, O Guerreiro começa com uma arma chamada de Sangramento, cujo efeito é acumular dano com as esferas normais (o jogo as chama de esferas-bebês). Além dessa esfera inicial, ele tem espaço para outras três bolas especiais e ainda dispara esferas-bebês.
Os efeitos das esferas especiais são diversos: a Bolsa de Ovos explode e gera quatro bolinhas bebês no cenário; a Queimadura arde por alguns segundos para causar dano contínuo; a Fantasma atravessa inimigos; e a Laser, que vem tanto na horizontal quanto na vertical, acerta todos os monstros em uma linha.
Há ainda mais quatro espaços para habilidades passivas. Entre elas, O Olho do Observador, que aumenta a chance de desviar de ataques, ou o Manto Etéreo, capaz de atravessar inimigos com força adicional. Minha favorita, sem dúvidas, foi a Bomba Relógio, responsável por explodir o monstro em sua morte, machucando outros inimigos ao ent.
Apenas com essa introdução básica, BALL x PIT já havia atiçado em mim aquela vontade curiosa de buscar a melhor combinação possível para superar a primeira camada do subsolo. Quais habilidades valem a pena? Como aumentar a taxa de disparos? E, mais que isso, como ajustar a mira para que bolinhas ricocheteiem, batam e rebatam para matar inimigos com eficiência?
Mas eu sabia que novos personagens me esperavam, assim como mais esferas especiais e outras habilidades passivas… Eu já estava vendido pela ideia e queria voltar. Não se engane: você vai falhar repetidamente no combate. Vai morrer uma, duas, três vezes, e a participação da boa sorte nisso é enorme. A fase de ação é o momento que exige reflexos e coordenação motora, tomada de decisão rápida.
Contudo, o que eu não imaginava é que… depois da trincheira, BALL x PIT me esperava com um outro tipo de jogo. Um momento que faz sentido e é completamente necessário. É um ciclo de tentativa e erro que te prende quase sem que você perceba – e, quando percebe, já está iniciando outra descida.

Intermissão (jogabilidade 2)
Não sei se é idade ou sempre foi essa a preferência, mas afortunadamente coincidências recentes me trouxeram jogos que se dividem em dois momentos: a fase de planejamento e a fase de ação. Em minha análise de Tiny Bookshop usei esses termos, e em BALL x PIT acontece o mesmo. A intermissão, ou seja, após finalizar uma trincheira com sucesso ou ao morrer nela, inicia-se a fase de planejamento, e é muito mais do que selecionar uma característica ou escolher outro personagem e seguir adiante.
Com a conclusão da camada, o personagem controlado recebe pontos de experiência permanentes – tornando-se mais rápido e mais forte para as incursões seguintes –, e o elevador te leva de volta ao alto do poço, onde uma vilazinha começa a se desenvolver, a Nova Bolalônia.
É hora de dominar um estranho jogo de gerenciamento e pinball (sim, pinball): para custear construções e, aos poucos, reconstruir a cidade, você precisa do ouro adquirido na batalha campal e de outros recursos. Edificações com propriedades específicas são desbloqueadas aos poucos, conforme encontramos diagramas deixados por inimigos nas trincheiras.
As primeiras são uma floresta e um campo de trigo, que podemos posicionar no pedacinho de terra ao redor do poço. Posicionamos as edificações, escolhemos um lugar e… elas não se constroem com o tempo… É necessário realizar a colheita, disponível uma única vez a cada intermissão.

A colheita funciona como um jogo de bilhar misturado com pinball: todos os personagens desbloqueados ficam na base da tela enquanto você mira uma linha tracejada em direção a campos e edifícios. Recolher recursos e construir um prédio depende de alguns golpes, isto é, algumas rebatidas do personagem sobre seus respectivos espaços. Por isso, é preciso direcionar bem a linha e, por alguns pouquíssimos segundos, O Guerreiro e todos os outros ficarão indo e voltando, batendo e rebatendo de parede a parede.
Ser preciso e colher em abundância traz recursos. Obter recursos acelera a construção da cidade, que, por sua vez, é composta por construções com características especiais: nada está lá à toa, de forma decorativa, pois alguns prédios aumentam a saúde, a resistência, a velocidade dos disparos… Outros são as casas de novos personagens.
E, para “piorar”, cada personagem que você usar para superar as camadas contribui para melhorar estes atributos. Desta forma, a intermissão transforma BALL x PIT em um jogo de administrar recursos na busca estratégica por eficácia na batalha ao criar um ciclo quase perfeito entre ação e respiro.
Uma vez feita a colheita, verifique se há prédios que aceitam ser melhorados (sim, eles têm upgrades). Tudo certo? Então tá bom, de volta ao elevador, para o centro da Terra!

Revoluções por minuto
A pura dinâmica já funciona, e é impossível abordar todos os aspectos mecânicos de BALL x PIT numa análise. A isca inicial é muito boa e a profundidade é fantástica, ainda que não soe completamente original. De volta ao poço, você escolhe qual camada vai visitar. O ideal é superar o desafio com todos os personagens para ter mais bônus ativos na cidade de Nova Bolalônia.
A duração média de um nível, do início a fim, é de cerca de 20 minutos, mas com auxílio de botões, dá para acelerar o tempo e, consequentemente, os movimentos de tudo no cenário, duas ou até três vezes, durante a jogatina. Se a coisa ficar caótica demais, desacelere. A escolha é só sua.
A variedade de combinações – considerando personagens, esferas especiais e habilidades passivas – traz resultados diferentes e uma dificuldade modular, montada bloco a bloco conforme suas escolhas.
Na fase de ação de BALL x PIT, uma barra lateral indica o ponto da fase no qual você se encontra, e quase todas são divididas em três partes, com encontros de chefes pelo caminho. As recompensas são diagramas, plantas para novas construções e, às vezes, engrenagens, que servem para permitir descidas mais profundas do elevador, rumo a novas fases.

Ainda na trincheira, as esferas especiais e as habilidades passivas têm três níveis e, – pasme –, como se não bastasse, às vezes encontramos moléculas de fissão por aí, itens que permitem criar fusões ou evoluir armamentos… como juntar uma bola de canhão com a esfera queimada para ter uma bomba em mãos, machucando inimigos próximos àqueles atingidos.
Por falar em inimigos, não pense que todos são esqueletos em caixotes. As barricadas de alguns lembram blocos de Tetris ou daquele jogo Cilada, da Estrela, e esse tipo tem muito mais resistência. Alguns possuem muralhas impenetráveis de gelo, e a única forma de acertá-los é lançar disparos em ângulos que os atinjam pelos lados. A forma de suas bases também afeta o resultado, afinal, o ângulo de cada parede direciona a esfera como numa mesa de bilhar, ou de pinball.
Eu disse que os inimigos eram passivos até chegarem à base da tela, né? Pois menti. Malditos os arqueiros e todos os monstros cuspidores de bolas de fogo, estacas de gelo e coisas do tipo. Movimentar é preciso, então não fique aí parado à toa. Movimente-se enquanto atira. Atire e mantenha a trincheira o mais limpa possível para evitar ser sufocado por monstros.
Cada descida no poço é uma viagem nova, com altas doses de adrenalina. Se for para apontar um defeito, seria dizer que BALL x PIT não conta com um modo cooperativo (ainda).

Visuais e sons
Os visuais apresentam modelos tridimensionais com perspectiva fixa. Não se deixe enganar pela aparente simplicidade, pois a direção artística é consistente e traz o que parece ser o estilo de jogos 3D do Nintendo DS para altas resoluções, com filtros de tela para simular uma TV antiga.
O resultado é uma hipnose gráfica, com um uso de cores terrosas e escuras, perfeitas para criar um clima mórbido incapaz de se levar muito a sério. E vale ressaltar que a legibilidade da ação jamais fica comprometida, já que é fácil ler a tela incrivelmente bagunçada por esferas, inimigos, gemas brilhantes de experiência e números de dano pipocando ao mesmo tempo. Mesmo quando dezenas de projéteis enchem a tela, e o movimento guia o olhar.
Embora os retratos em pixel arte sejam sombrios e algo macabros, não carregam o peso de se levar realmente a sério. Para deixar um exemplo, um personagem é composto, na verdade, por um casal – Os Coabitantes –, uma clara referência cartunesco-nefasta ao quadro American Gothic, de Grant Woods.
O tratamento de som e as composições graves acompanham o ritmo com batidas eletrônicas intensas, quase ansiosas, e silencia completamente durante os chefes ao fim das fases. Quando em alto e bom som, o ritmo eletrônico e gutural me fez colocar o fone no máximo durante a jogatina do almoço do trabalho.
Nas intermissões, compõem a calmaria de um lugar desolado em reconstrução. Parece um pensamento secundário, mas não é. Tanto visuais quanto sons trazem o equilíbrio ideal para contrastar tensão durante a fase de ação e respiro durante a fase de planejamento.

Antes de encerrar
BALL x PIT é surpreendentemente viciante. O game tem alta rejogabilidade, pois seus sistema de upgrades e combinações estimula novas tentativas. Some a isso as características peculiares do vasto elenco e as incertezas dos percursos e dos rebotes das bolinhas.
A curva elevada de dificuldade existe e seria o que muitos iniciantes chamariam de masoquismo, mas basta terminar um ciclo completo – entre fase de ação e planejamento – para notar que BALL x PIT fica progressivamente mais fácil com o tempo, graças aos atributos especiais das edificações e ao ganho de níveis. Por isso, diria tranquilamente que o jogo é muito acessível para a maioria.
Quanto ao desempenho, tecnicamente joguei a versão para Nintendo Switch no Nintendo Switch 2, quase sempre no modo portátil. Raramente notei quedas de quadros, o que tornou a experiência quase impecável. Por desencargo, liguei uma vez ou outra a opção de ver a taxa de quadros – oscilava muito pouco.
E isso é bom, pois a responsividade dos controles é ótima – imagino que mirar com mouse ou com toques na tela seja mais preciso, porém, mais uma vez, BALL x PIT correspondeu à expectativa e, com certa surpresa, rodou muitíssimo bem no Switch 2. Mesmo quando havia milhares de elementos na telinha.

Vale a pena jogar BALL x PIT?
BALL x PIT é um daqueles jogos que não me lembro como entrou no meu radar. Foi num Nintendo Direct?
De qualquer forma, fico muito feliz, pois BALL x PIT é um delírio digital que mistura precisão, sorte, planejamento e teimosia em doses quase perfeitas. O que começa como um caos incompreensível logo se revela um ciclo de tentativa e recompensa viciante, daqueles que te fazem dizer “só mais uma rodada”. Com 10 horas de jogo, eu não estava nem na metade das fases, muito menos com a metade dos personagens liberados. Minha estimativa é que eu demore pelo menos 25 horas para chegar perto do 100%
Gostaria de um modo cooperativo? Com certeza. Ainda assim, do jeito que está, BALL x PIT já é um dos jogos mais surpreendentes do ano. A sensação de desespero com tanta bolinha quicando e necessidade de ter tudo sob controle e de conseguir direcionar tiros para salvar a própria pele é “absolute videogame” dos anos 90. O título é um daqueles jogos que parecem pouca coisa à primeira vista, mas revelam um design rigoroso por trás do caos.
BALL x PIT é um híbrido insano, mas incrivelmente equilibrado. Um lembrete de que o caos, quando bem dirigido, é arte pura. É difícil largar o controle – e, quando você larga, já está pensando em mais uma descida. Exceto para crianças, recomendo BALL x PIT para todos!
BALL x PIT foi lançado em 15 de outubro de 2025 para Nintendo Switch, PlayStation 5, Xbox Series S|X e PC, via Steam.
*Review elaborada em um Nintendo Switch 2, com código fornecido pela Devolver Digital.
Ball x PIT
BRL 46,99Prós
- Loop viciante de ação e planejamento que prende o jogador por horas.
- Sistema de progressão inteligente e recompensador, com combinações quase infinitas.
- Direção artística coerente, com visual hipnótico.
- Trilha sonora e design de som que equilibram caos e calmaria.
- Desempenho sólido, mesmo no modo portátil do Switch 2.
Contras
- Caberia um modo cooperativo perfeitamente.
- História apenas funcional, sem maior profundidade narrativa.


