Powerslave Exhumed | Review

Conforme os anos foram passando, a indústria de games evoluiu de maneiras absurdas, tanto que hoje em dia qualquer pessoa com um computador pode desenvolver um jogo. E isso obviamente é algo extremamente positivo para a indústria, entretanto, como diria um velho sábio, “Com grandes poderes, vem grandes responsabilidades”. Todo esse acesso ao desenvolvimento de jogos acabou gerando problemas de visibilidade para jogos menores, pois imagine quantos jogos independentes incríveis existem por ai que você sequer ouviu falar.

Agora imagine quantos jogos desconhecidos incríveis existiram antes dos anos 2000, pois o que conhecemos de jogos dessa época são os clássicos da Nintendo, da SEGA e do PlayStation. Powerslave Exhumed é um desses jogos, esquecidos no tempo que acabou de ser relançado para todas as plataformas modernas. O game é uma edição remasterizada do jogo original lançado em 1998, chamado Powerslave, essa edição essa versão do jogo foi adaptada para a Kex Engine e desenvolvida pelo estúdio Nightdive Studios, que é conhecido por resgatar e modernizar jogos antigos.

Essa versão não trás melhorias de design no jogo original, mas sim melhorias técnicas, visto que o jogo não foi refeito, mas apenas trazido de volta (ou exumado). Dentre essas melhorias técnicas estão suportes para controle, suporte à telas Widescreen e HD Display, filtros de texturas e antiserrilhados, suporte a API gráficas modernas como DirectX 11 e Vulkan e, talvez a principal mudança, seja a união das versões de PlayStation e Sega Saturn do jogo, algo que vou explicar mais para frente. Isso tudo fora o fato de trazer de volta o título para PC e consoles.

E caso você se interesse por jogos antigos e a história da indústria de jogos, vem comigo para mais uma análise onde vamos entender um pouco mais sobre Powerslave Exhumed!

O que é Powerslave Exhumed?

Powerslave, Exhumed ou Seireki 1999: Pharaoh no Fukkatsu. É um jogo de tiro em primeira pessoa, desenvolvido pela Lobotomy Software e lançado oficialmente em 1996 para Sega Saturn, PlayStation e DOS. O jogo acabou virando um clássico cult ofuscado pelos incríveis lançamentos da época, como Quake, Duke Nukem 3D, Blood, e o marketing do Daikatana. Entretanto Powerslave é um excelente jogo, ainda mais por trazer uma temática e estética tão diferentes até para os dias atuais.

O jogo se passa na cidade de Karnak, uma antiga cidade egípcia, dominada por alienígenas e forças sobrenaturais e você, como protagonista e membro de um time de forças especiais, é mandado para essa cidade junto do seu pelotão para investigar e resolver o problema, porém ao chegar em Karnak o helicóptero é abatido restando apenas você, uma faca e uma missão. Eventualmente o protagonista encontra o espírito do faraó Ramsés (isso mesmo), que o alerta do perigo que a humanidade corre caso esses alienígenas encontrem objetos mágicos deixados nessas ruínas egípcias.

Como você pode imaginar, o foco do jogo não é a história, visto que ela serve apenas como uma desculpa para atirarmos em alienígenas e seres da mitologia egípcia. O destaque do jogo vai para sua gameplay, o jogo conta com uma arsenal extremamente criativo que vai desde armas de fogo como um revólver e uma metralhadora, mas também conta com armas mágicas como um cajado que atira cobras explosivas, uma granada mágica, e até mesmo magias antigas.

Powerslave Exhumed
As armas de Powerslave Exhumed, são bastante criativas e diferentes entre si (Imagem: Divulgação)

O jogo possuí um level design de dar inveja até mesmo em jogos atuais, que junto com a sua progressão traz realmente a sensação de estar explorando ruínas antigas. Powerslave possuí um sistema de progressão diferente, em que o jogador irá avançando nas diversas fases desbloqueando itens que lhe darão habilidades novas para acessar áreas antes bloqueadas em fases anteriores.

Por exemplo, a primeira habilidade desbloqueada é um pulo maior, que permite o jogador voltar em fases anteriores para explorar áreas antes inacessíveis. Outra habilidade é a capacidade de respirar embaixo da água, permitindo o acesso áreas inundadas também em níveis anteriores. E o jogo trabalha com esse sistema de forma muito inteligente, obrigando o jogador a decorar áreas até então inacessíveis para poder acessá-las no futuro.

Essa áreas servem para a progressão da história, mas também podem conter upgrades de vida, colecionáveis que desbloqueiam um final alternativo, atalhos para facilitar a movimentação nos níveis, entre diversas outras coisa. O jogo possuí uma extensa quantidade de coisas à se fazer em cada uma das fases, e explorar isso rejogando as fases com habilidades novas é algo extremamente recompensador por si só, algo que poucos jogos em 1996 conseguiam fazer nessa qualidade.

E como eu disse anteriormente Powerslave Exhumed é uma versão que tem como objetivo apenas trazer de volta o jogo, e não adapta-lo para o paladar moderno dos consumidores, isso é de certa forma positivo e negativo ao mesmo tempo, visto que essas qualidades mecânicas do jogo se mantém nessa versão, mas também os problemas da época. Entretanto, acredito que manter a identidade original do jogo para preservar a visão original dos desenvolvedores deve ser levado acima de tudo ao pensarmos em trazer de volta um jogo antigo. E a Nightdive Studios fez isso com maestria em Powerslave Exhumed.

Powerslave Exhumed
Artisticamente o jogo apresenta uma paleta de cores repetitiva que pode ser enjoativa ao longo da jornada (Imagem: Reprodução)

Nem toda relíquia antiga está bem conservada !

Powerslave Exhumed é uma edição que mantém conservado as características do jogo original, e isso é algo extremamente positivo. Preservar jogos antigos é preservar a história dos videogames e consequentemente a história da arte. Porém Powerslave é um jogo complicado, e ao mesmo tempo que apresenta uma temática bastante criativa e uma gameplay bastante variada, o jogo deixa a desejar em vários aspectos técnicos decorrentes da época.

Hoje em dia é difícil para desenvolvedores menores criarem jogos à altura de grandes produções, agora imagine isso antes dos anos 2000. Powerslave é um jogo que apresenta problemas de design claros, principalmente na questão de comportamento de inimigos e interface. Os inimigos do jogo em geral são bastante chatos de se enfrentar, visto que os inimigos “base” são apenas escorpiões e aranhas, que não andam, apenas pulam.

Acertar tiros nessas criaturinhas é algo extremamente desagradável, visto que eles são pequenos e rápidos em comparação com os inimigos base do clássico Doom ou Quake. Essa escolha de design é claramente falta de conhecimento de design de jogos dos desenvolvedores da época, e isso somado à estranhíssima e contra intuitiva interface, pode gerar frustrações para os desavisados.

O principal problema de interface do jogo se da nos recursos. O jogo apresenta somente dois deles, a vida e a munição, até ai tudo bem. Entretanto, os ícones de ambos os recursos são praticamente idênticos, dificultando a identificação no meio da ação frenética. Fora isso, todas as armas compartilham do mesmo item de munição, ou seja você terá que gerenciar quais armas você usará para pegar a munição certa. Esse gerenciamento de recursos pode ser sim algo positivo, porém a maneira que você consegue esses recursos é bastante irritante.

No meio das ruínas de Karnak há diversos vasos, caixas e estátuas quebráveis que lhe fornecerão vida e munição, porém cada um desses vasos pode conter uma vida grande ou pequena, uma munição grande ou pequena, mas também pode conter uma bomba que pode te matar com apenas um golpe e até inimigos, e essa decisão é gerada aleatoriamente.

Essa inconstância dos recursos gera situações extremamente desagradáveis, visto que você pode passar de uma parte com todas as munições cheias, mas sem vida, ou com a vida cheia mas sem o poder de fogo para continuar, e ao morrer e passar pela mesma parte esses recursos irão mudar. Porém, talvez a pior situação possível é você quebrar um vaso com a faca, pois você não tem mais munição, e acabar morrendo por uma bomba ou inimigo. E isso é uma situação impossível de prever e de evitar, visto que ao quebrar o vaso você pode morrer, ou pegar vida, ou munição.

Novamente quero ressaltar que em Powerslave Exhumed esses problemas de design do jogo original se mantém, visto que o foco da edição é trazer de volta o título original e não alterá-lo drasticamente.

Powerslave Exhumed
Karnak guarda segredos até então intocados, e cabe a você explorá-la (Imagem: Reprodução)

A exumação perfeita

Powerslave Exhumed é uma remasterização incrível dos jogos originais, visto que as versões de PlayStation, de Sega Saturn e de DOS, apresentavam diferenças gigantescas entre si, que vão desde estéticas, como a mudança da paleta de cores, e até mesmo o visual de alguns inimigos e armas. Isso tudo fora as diferenças mecânicas que havia entre as versões que apresentavam alguns inimigos com comportamentos diferentes. Para trazer de volta o jogo, Powerslave Exhumed juntou o melhor de cada versão em um único jogo, para trazer essa experiência para todos os públicos, sendo lançado para Playstation, Xbox, Nintendo Switch e PC.

Fora isso, Powerslave Exhumed apresenta também diversas customizações estéticas para os mais saudosistas, podendo alterar a paleta de cores das versões originais do jogo, e até mesmo aplicar um filtro que simula uma televisão CRT, vale ressaltar que todos esses filtros são customizáveis, mas honestamente as configurações padrões já são bastante competentes.

Outra feature nova, é a adição do suporte a controles, que é excepcional, permitindo o jogador customizar os comandos de acordo com sua preferência e trazendo junto disso um inventário em círculo para facilitar o manuseio das armas com o analógico. Essa adição é muito bem vinda, visto que o jogo está sendo lançado para todos os consoles da atualidade, e com certeza irá agradar todos aqueles que querem se aventurar em Karnak sentados no sofá ao invés de ficar no teclado e mouse.

O nome da edição Powerslave Exhumed também é uma boa escolha, pois como disse anteriormente o jogo possuí três nomes diferentes, sendo eles Powerslave (na América do Norte), Exhumed (na Europa) e Seireki 1999: Pharaoh no Fukkatsu (no Japão), então juntar os dois nomes mais populares do título original pode trazer de volta o público que jogou na época e que acabou esquecendo da sua existência. Então até o nome escolhido para essa edição foi bem pensado.

Powerslave Exhumed
Diferença após a aplicação de alguns filtros e shaders disponíveis no jogo. (Imagem: Divulgação)

Um antigo quebra cabeça à ser resolvido

Powerslave é um jogo complicado de fazer uma versão definitiva, e quando soube que a Nightdive Studios estava se arriscando nessa tarefa, confesso que fiquei bastante preocupado, visto que as três versões clássicas do jogo apresentavam diferenças consideráveis, porém o estúdio fez um excelente trabalho em juntar todas elas para criar a o que podemos dizer de versão definitiva de Powerslave.

A versão base utilizada aqui em Powerslave Exhumed é a antiga versão de Sega Saturn, considerada a versão original do jogo, pois é nela que podíamos jogar, na época o jogo como ele realmente é, com todo esse sistema de backtracking, as armas mágicas, inimigos diversos porém em um visual bastante simples para um jogo da época.

Já a antiga versão de PlayStation possuía visuais mais bem detalhados, entretanto como o hardware do PlayStation não era tão diferente assim do Saturn, os desenvolvedores tiveram que diminuir o tamanho dos mapas, tornando o jogo um pouco mais claustrofóbico, e consequentemente diminuindo a movimentação e a exploração do jogador, tudo isso em troca de polígonos mais bem trabalhados para o PlayStation. Fora isso, alguns outros detalhes técnicos foram aprimorados para o console da Sony, como o retrabalho visual nas aranhas do Saturn, que viraram escorpiões azuis para visualizá-los melhor no jogo.

No caso da versão de DOS, havia um jogo completamente diferente, um jogo sem as habilidades desbloqueáveis e consequentemente sem o sistema de backtracking, alguns inimigos funcionavam de maneiras diferentes, e também algumas armas funcionavam de diferentes formas, alterando drasticamente o gameplay das versões de consoles da época, e apresentando um outro jogo para os jogadores de PC, um jogo bastante inferior. Essa versão de DOS também está disponível no Steam, mas vale ressaltar que ela não é a melhor versão possível de Powerslave e não reflete a visão original dos desenvolvedores do jogo.

Powerslave Exhumed | Review
Foto demonstrando algumas diferenças visuais entre as versões de Playstation e Sega Saturn (Imagem: Gaming Palooza Empire)

A Nightdive entendeu quais eram as melhores características de todas as versões do jogo para criar a então versão definitiva do jogo (versão essa que eu duvidava ser possível existir), mixando todos esses elementos das diferentes versões do jogo para criar um porte digno para PC e para os consoles atuais, trazendo de volta um jogo mais parecido com a versão original de Sega Saturn, mas mantendo algumas melhorias visuais feitas para o PlayStation (inclusive nessa versão há tanto as aranhas quanto os escorpiões). E felizmente, para criar essa versão a Nightdive decidiu ignorar a versão original de PC, visto todos os problemas técnicos que ela tinha, tirando o fato de se tratar de um jogo à parte.

Lembrando novamente que toda a experiência visual do jogo é customizável, permitindo o jogador alterar entre os visuais originais de Saturn e de PlayStation, fora o filtro CRT que simula televisores antigos, então caso o jogador queira adaptar a experiência o mais próximo possível de qualquer uma das versões (exceto a de DOS) é possível aqui.

Vale a pena jogar Powerslave Exhumed?

Powerslave Exhumed é um jogo excelente, literalmente uma relíquia perdida na história dos jogos, porém o jogo apresenta problemas de design decorrentes da época que foi lançado originalmente, mas ainda sim é um jogo bastante único tanto visualmente e tematicamente, quanto em termos de gameplay e level design.

Um jogo tão único que não vimos nada parecido em todos esses anos da indústria de jogos. Powerslave é um jogo que influenciou diversos jogos de tiro que o sucederam aplicando conceitos de exploração e rejogabilidade no meio dos tiroteios, conceitos esses que nasceram aqui. É um jogo para aqueles que se interessam por jogos de tiro, pelos novos “boomer shooters”, e para aqueles que se interessam pela história dos videogames.

PowerSlave Exhumed foi lançado em fevereiro deste ano e está disponível para PC, via Steam e GOG.com, PlayStation 4, Xbox One e Nintendo Switch. O game conta com uma média de 81 pontos no Metacritic.

*Review feita em um PC equipado com uma GeForce GTX, com código fornecido pela Nightdive Studios.

Powerslave Exhumed

+ R$37,99
8.3

Gráficos e Som

10.0/10

Gameplay

8.0/10

Performance

8.0/10

Extras

7.0/10

Prós

  • Gráficos Customizáveis
  • Suporte à Controle impecável
  • Reúne o que cada versão original do jogo tem de melhor
  • Mantém a visão original dos desenvolvedores
  • Porte excepcional da Kex Engine

Contras

  • Problemas de design decorrentes da época
  • Falta de tradução PT-BR
  • Pode ser frustrante comparado à jogos modernos

Matheus Feldmann

Game Designer de formação, preservador de jogos antigos, amante de MMORPG's, Jogos de Luta, jogos indies e RPG's em geral. Também assumo o posto de maior defensor de jogos ruins, especialmente Daikatana.