Death Stranding (PC) | Review
Death Stranding, game produzido pela Kojima Productions originalmente para PlayStation 4 e posteriormente publicado pela 505 Games para PC, via Steam e Epic Games Store, foi um dos meus maiores (e melhores) desafios enfrentados em mais de 20 anos de jogador. Primeiramente, ter de lidar com toda a expectativa criada em cima da nova obra do aclamado Hideo Kojima, criador da série Metal Gear, não foi uma tarefa fácil.
Além disso, tentar compreender o que esse gênio insano quis passar por meio de uma obra tão complexa e densa, repleta de história (e que história!), personagens (ponto chave do game) e muitas conexões, requer certa paciência e, sinceramente, muita reflexão. Por último, ainda tive que tentar me desligar da admiração que tenho por Kojima e todo o seu legado. Afinal de contas, consciente e inconscientemente procuramos repetições e traços familiares à nossa percepção, e nos jogos isso também se repete. Mas, já adianto que Death Stranding vai além de tudo que foi visto antes. E isso pode não agradar a todos. E tudo bem.
Certamente você que chegou até aqui está bem curioso, buscando saber mais detalhes desse jogo tão misterioso. E calma, vou falar tudo. Mas fique tranquilo que essa crítica não dará nenhum spoiler sobre a narrativa, e se focará em analisar o game de uma maneira geral, explicando o que você vai encontrar nessa grande aventura sobre pessoas, conexões e o mundo de hoje e como ela está ainda melhor no PC!
Antes de mais nada… Death Stranding é um “walking simulator”?
Uma das criticas mais rasteiras que andaram circulando na internet desde a divulgação dos trailers e de mais informações de Death Stranding são as críticas feitas apenas pelos primeiros vídeos. “Walking simulator“, foi um dos apelidos dados a obra de Kojima. Há sim certo sentido pra isso, mas a coisa vai muito além. No jogo, você encarna Sam Porter Bridges, com a belíssima atuação de Norman Reedus, conhecido por seu papel de Daryl Dixon em The Walking Dead. Sam habita um mundo completamente quebrado, em que os Estados Unidos da América já não é mais uma república, tornando-se a UCA: United Cities of America (Cidades Unidas da América), sendo uma clara alusão à atual situação do país (Kojima já deixou claro que o jogo trata de algumas questões relacionadas a política e sociedade não só de lá, mas do mundo todo).
Mas voltando a grande questão do jogo ser de fato ou não um simulador de entregas. Death Stranding realmente te faz andar por longos e acidentados caminhos. Aliás, caminhos maravilhosos. Mas anime-se: você pode utilizar alguns veículos que podem ajudar a agilizar (e muito) as tarefas de Sam. Mas, de qualquer forma, se prepare para andar bastante, pois alguns terrenos são extremamente irregulares e desafiadores, anulando assim os veículos. Nesse ponto, alguns jogadores podem se irritar, pois as entregas acabam por se repetir ao longo do gameplay, sobretudo nos primeiros três longos capítulos, tornando o início do jogo em uma experiência morna. E é frustrante quando fracassamos em uma entrega e temos que reavaliar toda a nossa rota e formas de transporte.
Quem é Sam Porter Bridges?
E neste mundo, Sam é basicamente um entregador. Sim, sem aspas. Claro, não é tão simples assim e com o desenrolar da trama, as coisas vão tomando forma e o personagem vai mostrando a sua importância. A cada entrega concluída e a cada vínculo feito com os personagens, os preppers, Sam conecta as cidades e pontos isolados a algo chamado Rede Quiral, que é muito semelhante com a nossa internet.
Essas conexões compartilham uma série de conhecimentos mas, ao mesmo tempo, parecem vigiar cada um dos membros interligados, lembrando bastante (dentro das proporções, claro) o Grande Irmão (Big Brother) da obra 1984, de George Orwell. Nela, o Grande Irmão “tudo vê e por todos zela”. Imagine se a tal poder de acesso cai nas mãos erradas? É, o jogo te faz pensar demais tanto em sua própria trama, quanto no mundo ao nosso redor. E é exatamente esse o papel da arte.
Há ação em Death Stranding?
As andanças e entregas não são tão simples assim. Em Death Stranding as coisas vão além disso. Na verdade, você luta o tempo todo com a vida e… com a morte! Sim, a famigerada morte está constantemente presente aqui. As chamadas EPs são entidades que desencarnaram, mas seguem presas ao plano terreno. Em diversas áreas, elas te perseguirão e darão um trabalhinho legal. Mas, para tudo há um jeito: é só as evitar ao máximo que tudo corre bem. E os jogadores sinalizam bastante isso pra você. E para detectá-las, entra a coisa mais fofa desse jogo: BB (Baby Bridge)! Sim, aquele bebezinho que fica ligado a Sam e que apareceu por diversas vezes nos trailers é o responsável por detectar e tornar visíveis as assombrações.
Como se não bastasse, os vivos também trazem problemas e em duas versões diferentes: os MULE e os Homo Demens, que são basicamente fanáticos terroristas. Os primeiros são acumuladores e ladrões que vivem espalhados pelos territórios da UCA. Contudo, estes não utilizam armas letais, sendo mais fáceis de se lidar. Já os Homo Demens, grupo que vai contra a expansão da Rede Quiral e age radicalmente, tocando o terror: seus membros usam armas letais e te caçam implacavelmente. Portanto, tome cuidado e os evite ao máximo!
Matar é sempre um grande problema
Aqui entramos em um ponto crucial de Death Stranding: matar não é uma opção viável. Caso você utilize armas letais e assassine os inimigos, o risco de existirem mais zonas de EPs é maior, algo que poderá trazer problemas ao longo da longa narrativa. Pior ainda, se alguma EP entra em contato com um corpo, ocorre uma grande explosão, que deixa o cenário marcado com uma grande cratera. Passar por essas zonas é trabalhoso demais e pode facilmente te matar.
Nesse ponto, a obra de Kojima se afasta do que é convencional, fazendo o jogador pensar nas várias possibilidades de ação ao longo do enredo. E é interessante sair dessa fórmula ocidental de jogos, onde a morte parece ser um obcecado objetivo. Inclusive, isso também está presente em Metal Gear Solid V: The Phantom Pain, mas não da mesma maneira, é claro. No jogo em questão, você pode optar não matar os inimigos, os atordoando e, assim, os recrutando forçadamente para seu exército de mercenários. Em um caso mais intenso, em Metal Gear você também não pode matar crianças e, caso isso aconteça, a missão é abortada. Enfim, retornado a Death Stranding, passado, presente e futuro estão diretamente ligados e a lei da ação e reação pode ser observada aqui. Portanto, esteja avisado sobre os riscos.
Um mundo compartilhado com diversos jogadores reais
Uma das coisas mais bacanas de Death Stranding é a forma de “interação” dos variados jogadores e o mundo. Não, você não encontra ninguém no caminho, mas tem acesso a uma variedade de construções e apetrechos deixados por outros jogadores. Pontes, cordas para escalada e escadas em terrenos montanhosos, caixas postais em que é possível compartilhar e guardar diversos recursos e itens, placas de sinalização para auxiliar o trajeto, etc. Tudo é feito pela comunidade e para a comunidade.
Death Stranding é um jogo singleplayer e pode ser jogado offline. Porém, para desfrutar dessa sensação de viver em um mundo com outros, deve ser jogado online. Estranhamente todos nós estamos conectados neste caótico mundo criado por Hideo Kojima. E o mais engraçado disso tudo é que você pode “curtir” cada construção encontrada, tal como fazemos no Facebook. Isso mostra a gratidão por encontrar uma construção em um local onde as coisas podem apertar. Um exemplo bastante comum é quando as chuvas temporais castigam o jogador e vão corroendo seus itens e, no meio do nada, alguma alma caridosa deixou construído um abrigo para restaurar a carga e se proteger da chuva. Ou quando a bateria de seu veículo está no limite e você acha um ponto de recarga. Nossa, é um alívio imenso e uma sensação de fazer parte de algo maior.
Nessas construções, é possível que você entregue materiais para a manutenção, já que a ação do tempo vai deteriorando as estruturas. O jogo cria um senso de comunidade muito forte, evidenciado na ajuda mútua para chegar ao mesmo objetivo, sendo uma experiência interessantíssima, mesmo para um game tecnicamente single player. Ajude aos outros jogadores construindo estruturas e sinalizando possíveis problemas no caminho.
Bem além de um simples jogo
Desde o seu anuncio durante a E3 2016, o então misterioso Death Stranding fez surgir muitas perguntas, sobretudo após a conturbada saída de Kojima da Konami. Desde então, a cada novidade, a comunidade ficava ainda mais curiosa. Como fã do japonês, confesso ter ficado animado com todo o reboliço causado desde então. E ele merecia esse momento, ainda mais depois de todos os problemas com a Konami no final da produção de Metal Gear Solid V.
Mas o que me deixou ainda mais motivado foi ver a presença de atores consagrados como o já citado Norman Reedus; Mads Mikkelsen, famoso pela brilhante interpretação do lendário Hannibal Lecter na série Hannibal, Léa Seydoux, conhecida pelos filmes como Bastardos Inglórios e Azul É A Cor Mais Quente; Troy Baker, conhecido por dar a voz a personagens como Talion em Terra-Média: Sombras de Mordor, Joel em The Last of Us e Ocelot em Metal Gear Solid V: The Phantom Pain; o diretor ganhador do Oscar, Guillermo del Toro, que empresta suas feições para o personagem Deadman, e tantos outros. Inclusive o hilário Conan O’Brien faz uma ponta no jogo, sendo um dos preppers. Ou seja, você encontrará muitos rostos conhecidos.
Nesse ponto, a captação das faces em 3D ficou sensacional. Os movimentos são muito bem definidos, sobretudo em cada uma das variadas cutscenes. Isso tudo ocorreu graças à captura de movimentos feita em estúdio, onde os atores realmente contracenaram. Em diversos momentos o jogo se confunde com um filme, tamanha a preocupação na elaboração de cada cena. Os diálogos se aprofundam a narrativa, tornando a experiência em algo único. Aliás, os gráficos, que já eram lindos no PS4 estão ainda melhores no PC. O jogo agora conta com suporte a alta taxa de quadros, compatibilidade para monitores ultra-wide e suporte para a tecnologia NVIDIA DLSS 2.0. Ainda sobre o desempenho no PC, o jogo conta com requisitos relativamente medianos para ser rodado em seu mais alto nível gráfico.
A história do jogo
Aliás, o jogo tem um roteiro excelente. E quem me conhece sabe que em toda santa crítica que faço, prezo por falar (positivamente ou não), da história. E, sem entrar em muitos detalhes, posso dizer que subir e descer morros, entregar cargas pesadas a pé ou em veículos, se estressar com as dificuldades dos caminhos, tudo isso, vale muito a pena.
A gente gradativamente se apega aos personagens, que contam com uma carga emocional surreal. Aliás, como não amar BB que, ao ser ninada, solta várias bolhinhas em forma de coração e dá um sorriso para o sério Sam? Um ponto interessante é poder ouvir o choro do bebê a partir do DualShock. Para acalmar a criança, você deve fazer movimentos de ninar com o controle, dando uma certa sensação de que o bebê está com a gente o tempo todo, nas nossas mãos. Esse pequenos detalhes nos conectam ainda mais com a ideia de Kojima e tornam o jogo ainda mais especial.
Tais aspectos tornam Death Stranding em uma experiência muito maior que um mero produto do entretenimento (embora ainda o seja). Abordar questões sobre conexões e, mais do que isso, conectar os próprios jogadores, que muito provavelmente nunca se encontrarão, é algo bonito. Mais interessante ainda é poder jogar e simultaneamente estar dentro de um denso filme, digno de Hollywood. Aliás, Hideo Kojima pode facilmente ser um diretor de cinema, sendo inclusive muito elogiado por George Miller, diretor de Mad Max: Rota da Fúria.
Alguns pontos a serem discutidos sobre Death Stranding
Embora o jogo seja sim uma obra-prima, ele tem suas questões. Para mim, a maior delas é a física complexa dos veículos, que travam ou batem diversas vezes no cenário (muitas vezes em uma pedrinha mínima). Isso é irritante! Em diversas ocasiões também tive o desprazer de ficar agarrado, sendo desesperadora a sensação de ter sua missão frustrada, te obrigando a descer do veículo e seguir toda a viagem a pé.
Por isso, sempre tenha consigo os tratores, que são carrinhos de transporte flutuantes. Eles serão muito úteis onde os veículos falharem. Sinceramente, no final acabei aceitando a sina com os veículos e simplesmente fiz as entregas a pé, contemplando a vista e fugindo dos embates com os humanos e as EPs. Nesse ponto, a física do jogo poderia se aprimorada, mas não estraga a experiência. Ou talvez essa tenha sido a ideia de Kojima, de tornar os caminhos de Death Stranding cada vez mais tortuosos e repletos de pedregulhos para desafiar os jogadores.
Outra questão que pode ser chata para alguns e que eu falei mais acima, são as incontáveis entregas. Uns podem achar esse processo meio monótono; outros, mais apressadinhos, podem pensar que a experiência é frustrante e pouco fluída. Aliás, o ritmo dos primeiros três capítulos é um pouco lento e introdutório, podendo ser entediante. O próprio diretor da Sony disse que o jogo “parece estar começando mesmo depois de 10 horas”. E é realmente essa a sensação. Francamente, não achei isso ruim. Durante a aventura, sempre aparece uma novidade para aprimorar ainda mais a jogabilidade e a vida do nosso sofrido Sam. Por fim, o Modo Foto do jogo é um show à parte, onde você certamente perderá horas e horas fotografando Sam, BB e várias paisagens incríveis, sendo essa uma adição incrível ao jogo.
Vale a pena comprar Death Stranding?
Reunindo excelente jogabilidade e uma trama de arrancar lágrimas (sim, me emocionei mesmo), Death Stranding mostra, mais uma vez, o motivo por qual amamos Hideo Kojima: o game aborda assuntos contemporâneos de uma forma leve e que, provavelmente, poucas pessoas terão tato para perceber. Sim, Death Stranding é um jogo de certo teor político, quer você aceite ou não, algo que o próprio criador já deixou claro em entrevistas. Mais do que político, é uma narrativa que trata sobre a vida na atualidade, as conexões, os prós e contras de se estar digitalmente (e constantemente) conectado. Enfim, a conexão entre pessoas é extremamente abordada em toda a narrativa e isso cativa o jogador a ir além. Sobre a jogabilidade, os menus são simples, e o jogo é todo muito bem explicado, contando inclusive com uma parte específica que mostra a utilidade de cada arma ou acessório.
É bom ficar de olho aos e-mails que vão chegando, pois eles também dão importantes dicas e contam mais da história. Os detalhes em Death Stranding fazem toda a diferença. Cada estrada concluída, ponte construída, tudo é importante. Se conecte a esse mundo, aos outros jogadores e personagens e aproveite ao máximo dessa experiência. Vá aberto às novidades e tenha paciência. Aprenda com o jogo e se concentre. Se envolva, se conecte e reflita sobre tudo. Valerá muito a pena no final (terminei com 37 horas), mesmo com alguns contratempos e falhas. Tudo ditado por uma trilha sonora maravilhosa!
Com uma excelente opção de dublagem em português, gráficos e desempenho ainda melhores na versão de PC, e uma história maravilhosa, Death Stranding está disponível para PlayStation 4, por R$ 149,00 e PC, via Steam e Epic Games Store, por R$ 239,00.
*Review elaborada em um PC equipado com GeForce GTX, com código fornecido pela 505 Games.
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